Esses resultados, diz Francine, preocupam, pois a demanda física elevada a que os jogadores são submetidos, associada a uma alimentação inadequada, pode levar os atletas ao estresse oxidativo, ou seja, ocorre um desequilíbrio em favor da formação acentuada de radicais livres pelo corpo e ao combate das defesas antioxidantes, o que faz os atletas sofrerem mais lesões, fadiga precoce, prejuízo na fase de recuperação pós-exercício ou jogo, diminuição na função imunológica e aumento de inflamações. Com esse quadro, diz, eles têm mais chances de adoecer e, consequentemente, também influencia na performance do atleta. “Por se tratar de adolescentes, esses efeitos podem ocasionar problemas no crescimento e no desenvolvimento”, afirma Francine.
Para a pesquisadora, ficou evidente a importância de uma adequada nutrição e a necessidade de uma educação nutricional no meio esportivo. “É necessário o acompanhamento e orientação individualizados, possibilitando um consumo alimentar balanceado, evitando deficiências ou excessos alimentares, prevenindo assim danos excessivos causados pelo exercício físico crônico”. O objetivo do estudo foi avaliar o estado nutricional e estresse oxidativo de jogadores de futebol. A amostra foi composta de 20 atletas de futebol adolescentes, em período competitivo, com média de 16 anos, Índice de Massa Corpórea (IMC) de 21,9 Kg/m2 e 2,6 anos de experiência futebolística.
Os jovens foram submetidos a um jogo treino de 60 minutos contínuos de duração, e avaliados em três momentos: antes do jogo, 30 minutos após o término e 24 horas após. Segundo a pesquisadora, foi avaliado o estado nutricional a partir de antropometria — composição corporal e IMC — e exames bioquímicos para perfil lipídico — colesterol total e frações. Também foram realizados exames para dano muscular — enzima creatina quinase e creatinina— e estresse oxidativo, com técnicas para verificação de danos aos componentes lipídicos e protéicos celulares, e defesa antioxidante não enzimática, representada pelas vitaminas antioxidantes E, C e A e glutationa reduzida. A ingestão alimentar foi determinada por meio de registro alimentar de três dias antecedentes e não consecutivos à partida avaliada.
Os resultados mostraram que o percentual de gordura corporal foi semelhante em todos os métodos utilizados para avaliação da composição corporal, ficando em torno de 11%, o que é esperado para atletas, e em conformidade com outros trabalhos. Já a ingestão energética média foi de 37,6 kcal/kg. “Esse percentual está dentro dos valores de recomendação, porém com uma distribuição de macronutrientes inadequada, apresentando uma dieta rica em proteínas e em gorduras e pobre em açúcares.”
Perfil lipídico
Francine afirma que o perfil lipídico apresentou-se dentro dos valores recomendados e não sofreu alterações com o estresse físico durante as três avaliações da partida. Porém, a enzima creatina quinase (CK) e a creatinina aumentaram significativamente 30 minutos após o jogo, demonstrando dano muscular, porém voltaram aos valores basais — de antes do jogo — após 24 horas da partida. Para a pesquisadora isso evidencia uma sobrecarga dos músculos na partida em que esses jogadores foram avaliados, demonstrando que foi um jogo de grande intensidade, causando lesões musculares, porém ainda com o organismo conseguindo se recuperar no dia seguinte.
“Com os treinos e competições e o fato de diversos campeonatos ocorrerem simultaneamente, essa sobrecarga é preocupante, pois provavelmente não há tempo suficiente para recuperação, tornando tal problema um ciclo vicioso, ou seja, o atleta não tem tempo de se recuperar e já é submetido a um novo estresse físico, aumentando ainda mais os problemas relatados”, diz a nutricionista.
“Um dado preocupante da pesquisa é que nenhum jogador atingiu as necessidades de ingestão de vitaminas E e A, recomendadas pela Ingestão Dietética de Referência (DRI), e 65% atingiram para a vitamina C, mas não houve homogeneidade no grupo para esta vitamina”, explica. Já os valores sanguíneos para tais vitaminas também aumentaram significativamente com 30 minutos após o término da partida, sendo que as vitaminas E e A ainda mantiveram-se elevadas no dia seguinte.
A pesquisadora relata que o recrutamento da defesa antioxidante não enzimática, principalmente às custas dessas vitaminas dietéticas, impediu a ocorrência de peroxidação lipídica, ou seja, não chegaram a ocorrer danos aos componentes lipídicos, representado pelo teste bioquímico Substâncias Reativas ao Ácido Tiobarbitúrico (TBARS), o qual não apresentou alterações significativas em nenhum momento avaliado. “Como a ingestão estava deficiente, se chega à conclusão de que, provavelmente, isso aconteceu devido à mobilização dessas vitaminas nos estoques corporais. Porém, se a ingestão alimentar continuar inadequada, isso com certeza prejudicaria essa positiva reação antioxidante dessas vitaminas e ocorreriam danos celulares”, explica Francine.
Por outro lado, diz, a nossa defesa endógena, formada por compostos antioxidantes já presentes no nosso organismo como, por exemplo, a glutationa reduzida, não foi suficiente para combater a oxidação protéica, visto que apresentou um aumento das proteínas carboniladas 24 horas após o jogo. Isso significa que os jogadores apresentaram um aumento preocupante de radicais livres provenientes de proteínas, demonstrando um dano aos componentes protéicos celulares do corpo.
A pesquisadora lembra que, nos últimos anos, vários estudiosos já identificaram o interesse em determinar as atribuições físicas, fisiológicas e psicológicas de jogadores de futebol a fim de identificar precocemente novos talentos. Ela ressalta, no entanto, que existem poucas informações sobre o estado nutricional e hábitos alimentares de jogadores de futebol adolescentes.
A pesquisa Perfil Nutricional e Estresse Oxidativo de Jogadores de Futebol Jovens foi orientada pelo professor Alceu Afonso Jordão Junior e defendida no mês de outubro de 2011.
* Publicado originalmente no site da Agência USP.
(Agência USP)