Lisboa, 31/08/2009 – Uma equipe de cientistas portugueses demonstrou que um medicamento antioxidante oferece proteção natural contra as formas mais agressivas de malária, doença responsável por um dos mais altos índices de mortalidade mundial. Em um artigo publicado pelas revistas Ciência Hoje, de Portugal, e Proceedings of th National Academy of Sciences, dos Estados Unidos, são detalhados os importantes progressos no estudo dos cientistas do Instituto Gulbenkian de Ciência, de Lisboa, encabeçados pelo doutor Miguel Soares.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) explica que a malária é
causada pelo parasita Plasmodium, que em muitas regiões do mundo se tornou
resistente a vários medicamentos. É transmitido através da picada de mosquitos
anofeles fêmea infectados. No organismo humano, os parasitas se multiplicam no
fígado e depois infectam os glóbulos vermelhos, causando anualmente em todo o
mundo mais de 10 milhões de mortes de crianças antes de completarem os 5 anos, a
faixa etária que constitui 85% das mortes por malária. Na África, continente
mais afetado pelo flagelo, se concentram 90% de todos os casos. A cada 30
segundo se registra um óbito infantil devido à malária, doença responsável pro
18% das mortes de menores de 5 anos, segundo estatísticas do Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef).
Soares e sua equipe já haviam provado
que a multiplicação do Plasmodium dentro dos glóbulos vermelhos, as células que
transportam o oxigênio dos pulmões para os tecidos, provoca a ruptura destas
células e a liberação da hemoglobina par à correntesanguínea . Quando a
hemoglobina libera seus grupos heme (quatro centros de ferro a traves dos quais
o oxigênio se liga à hemoglobina) estes grupos causam os sintomas graves de
malária. No novo estudo divulgado pela Ciência Hoje, os pesquisadores afirmam
que ratos infectados com Plasmodium produzem níveis elevados de enzima hem
(oxigenase) 1(HO-1), que degrada os grupos heme livres, dessa forma protegendo
os ratos infectados com as formas mais graves de malária.
Além disso, o
efeito da enzima HO-1 pode ser mimetizado por administração de antioxidante
Nacetilcisteína (NAC) aos ratos infectados. Soares explica que “o efeito
antioxidante da enzima HO-1 faz parte do sistema de defesa natural do hospedeiro
contra o parasita da malária, proporciona forte proteção contra a doença,
surpreendentemente sem interferir diretamente com o parasita”. Em alguns casos,
prossegue, “a própria reação do hospedeiro contra o parasita é o que causa a
morte do primeiro”, afirma o cientista na revista publicada esta
semana.
Esta conclusão abre novos caminhos para terapias alternativas
que, ao contrário dos tratamentos existentes, “não interferem diretamente com o
parasita e reforçam o estado de saúde do hospedeiro, e assegura que este seja
capaz de eliminar o parasita, sem arriscar sua própriasobrevivência ”, garante
Soares. “Esta terapia será eficaz para proteção contra formas graves de malaria,
salvando vidas, sem favorecer o surgimento de estirpes de parasitas
resistentes”, acrescenta, explicando que este avanço “poderá ter implicações
para os tratamentos de outras doenças que causam inflamação”.
Em sua
documentação oficial, a OMS explica que, entre seus sintomas, destacam-se febre,
cefaleia e vômitos, e que, se não for combatida, a malária pode colocar em
perigo a vida do paciente em pouco tempo, pois altera o envio de sangue a órgãos
vitais. Cerca de 40% da população mundial que vivem nos países mais pobres estão
expostos à essa enfermidade, que faz mais de um milhão de vidas ao ano e outros
400 milhões ficam gravemente doentes anualmente. Os cinco Países Africanos de
Língua Oficial Portuguesa (Palop) e a ex-colônia portuguesa Timor Leste, no
arquipélago indonésio, fazem parte da lista dos mais afetados pela
malária..
Depois da independência em 1974 da Guiné-Bissau; em 1975 de
Angola, Cabo Verde, Moçambique e São Tomé e Príncipe, os outros membros do grupo
Palop, e Timor Leste em 2002, Portugal mantém uma vasta cooperação na área de
saúde. Isto porque este país “tem uma responsabilidade especial, política,
histórica e ética com o grupo Palop e Timor Leste”, disse à IPS o doutor Jorge
Torgal, diretor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical de Lisboa. Recordou
que até às respectivas independências, Portugal era “responsável pela saúde nas
colônias e depois, ao, felizmente, acabar essa situação, nossa atividade se
transformou em cooperação para o desenvolvimento na área social com esses
países”.
Os novos progressos da equipe de Soares poderão servir a estes
propósitos da cooperação luso-africana, em especial em Moçambique, que com 10%
de bebês que não chegam a completar um ano conta com uma das taxas de
mortalidade infantil mais altas do mundo, devido, em primeiro lugar, à malária,
de acordo com dados do Unicef. Cifras comparáveis às da República Democrática do
Congo (RDC), onde a malária mata 180 mil pessoas por ano e é a principal causa
de óbitos em um país onde 97% dos 60 milhões de habitantes vivem em áreas onde a
doença é endêmica. IPS/Envolverde
(Envolverde/IPS)