Saúde: Algo mais do que combater doenças

Seattle, Estados Unidos, 26/08/2008 – A agenda mundial da saúde se concentra no tratamento de doenças, não em atender outras faces do problema, com a desnutrição e as insuficiências de infra-estrutura, e esse enfoque pode ser contraproducente, afirmam alguns especialistas. No final do mês passado, o presidente George W. Bush assinou um pacote de US$ 48 bilhões que triplicará nos próximos cinco anos o gasto dos Estados Unidos na luta contra Aids,  e tuberculose nos países pobres. O chamado Plano de Emergência Presidencial para o Alívio da Aids remonta a 2003, e ajudou a comprar grandes quantidades de remédios anti-retrovirais para mais de 1,4 milhão de portadores do vírus HIV, causador da aids. A intenção da nova injeção de dinheiro é que este Plano de Emergência cubra três milhões de portadores até 2015. Este é o tipo de modelo que define atualmente a agenda mundial de saúde, alertam especialistas norte-americanos. Os Estados Unidos não estão sozinhos. O Fundo Mundial de Luta contra a Aids, a Tuberculose e a Malária, com sede em genebra, financia o tratamento de aproximadamente 1,4 milhão de pessoas.
Tanto a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas como o Grupo dos Oito países mais poderosos do mundo declararam seu apoio ao princípio de acesso universal aos medicamentos anti-retrovirais. A luta contra a Aids e outras enfermidades destacadas também é o que move um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. De todo modo, e apesar das quantias maciças de dinheiro que movimenta, a agenda mundial de saúde ainda está em sua infância e é objeto de intenso debate, dizem especialistas.

Ruth White, professora de sociologia e antropologia na Universidade de Seattle e ativista humanitária, disse que o enfoque atual concentrado no tratamento das doenças é, de certo modo, contraproducente. "Resulta perigoso porque desvia recursos que deveriam ser ampliados a outros setores para ter um impacto mais geral na saúde, em lugar de se concentrar nos esforços em favor daqueles que têm uma doença ignorando os que têm outras", explicou White. "A nutrição básica pode ajudar a dar a imunidade que permita impedir ou reduzir os efeitos da malária, da Aids e da tuberculose. Quando uma pessoa está desnutrida, tende a não ser saudável e ser mais susceptível a contrair essas doenças", acrescentou. White não é a única voz em Seattle que costuma se referir à saúde mundial.

Esta cidade norte-americana é sede da principal iniciativa privada do plante dedicada ao assunto, a Fundação Bill e Melinda Gates, que emprega mais de 620 pessoas, conta com US$ 65 bilhões e já outorgou US$ 16,5 bilhões a diversos projetos desde sua criação em 2000. Bill Gates estabeleceu o HIV/Aids com prioridade de sua fundação, que destinou enormes somas de dinheiro a projetos de luta contra essa doença na África subsaariana, a região mais afetada do planeta. Mas, o jornal norte-americano Los Angeles Times acrescentou que o enfoque restrito da Fundação em doenças de alta visibilidade, especialmente o HIV/Aids, tem conseqüências problemáticas.

O jornal informou que os critérios da fundação levaram os que recebem suas doações a exigir a contratação de pessoa de saúde altamente especializado, o que reduziu o dedicado à atenção médica básica. Além disso, os projetos financiados pela fundação deixam de lado necessidades básicas como nutrição e transporte, segundo o Los Angeles Times. Em muitas ocasiões, os portadores vomitam os anti-retrovirais que recebem gratuitamente por causa da desnutrição, e outros carecem de dinheiro necessário para ir até as clínicas que fornecem tratamento. A fundação rejeitou o pedido de entrevista feito pela IPS.

Parte do problema está na falta de compreensão das necessidades das comunidades locais, segundo Loyce Mbewa-ONG'udi, presidente do Projeto Povoado Rabour (RVB), organização não-governamental de assistência com sede em Seattle que opera na localidade queniana de mesmo nome. "Não se pode ir às comunidades com um programa pré-estabelecido. Nesse caso são necessárias melhorias. As comunidades sabem o que querem e do que precisam. Entendem suas próprias prioridades", disse a ativista. Mbewa-ONG'udi acredita que o maior problema de enfoque de algumas organizações está na falta de contato com as comunidades rurais africanas, onde reside a maior parte da população do continente.

Como muitas instituições dedicadas à assistência operam em grandes centros urbanos, não conseguem ver o desafio que têm na área rural. Além disso, tendem a subestimar os conhecimentos dessas comunidades. O RBV coopera com membros da comunidade, e se concentra em espalhar conhecimentos sobre saúde e desenvolvimento através de um comitê comunitário e da capacitação de meia centena de homens e mulheres em atenção básica da saúde. O trabalho da organização vai algo mais além da Aids. Dedica-se ao desenvolvimento de indústrias locais, com a fabricação de tijolos, produção de óleo de girassol e de leite de cabra, bem como a um programa de microcrédito. Também perfurou um poço artesiano e procura instalar um sistema de distribuição de água para as casas e a agricultura.

White coincide com esse enfoque e considera que deveria ser o dominante. "Não há humildade suficiente nem vontade de ser aliados em iguais condições em nossos esforços no terreno. Poderemos ter os conhecimentos técnicos, mas as comunidades locais têm os conhecimentos culturais e técnicos de que precisamos para sermos mais efetivos e eficientes", afirmou. Porém, a ênfase em doenças como a Aids continua sendo um obstáculo a ser vencido. "A Aids e a tuberculose aterram o público do mundo rico porque têm alcance mundial e estão se propagando", disse o jornalista Charles Piller, do Los Angeles Times, que investigou a fundo as operações da Fundação Gates.

As razões para esta ênfase são compreensíveis. A Organização Mundial da Saúde calculou que 33,2 milhões de pessoas são portadores de HIV, dos quais 22,5 milhões vivem na África subsaariana. Morreram em conseqüência da aids 2,1 milhões. Mas outras preocupações são desatendidas. "No longo prazo, fornecer água potável seria um modo muito melhor de conseguir avanços na saúde pública em regiões como a África, mas o custo da infra-estrutura é muito alto", disse Piller.

Um quinto da população mundial carece de acesso à água potável e dois quintos ao saneamento básico, uma situação que deriva na morte de mais de cinco milhões de pessoas por ano, segundo a organização não-govenamental Water First International. "Vamos destinar cem vezes mais dinheiro à assistência contra a malária do que a dedicada à água", disse Kirk Anders, desta instituição internacional com sede em Seattle. (IPS/Envolverde)


(Envolverde/IPS) 
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