Estudo avalia sites na internet que oferecem programas de emagrecimento e conclui que reeducação alimentar ocupa cada vez mais o lugar da tradicional dieta rigorosa foto: NIH)
Uma nova pesquisa analisou sites que oferecem programas de emagrecimento. O estudo, de caráter exploratório, constatou que modelos oferecidos na internet já incorporam a reeducação alimentar no lugar da tradicional dieta rigorosa.
De acordo com a
autora Ligia Amparo da Silva Santos, professora adjunta no Departamento Ciências
da Nutrição da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o
objetivo do trabalho foi chamar a atenção para uma prática muito utilizada por
quem deseja perder peso.
"A ciência não tem
explorado os sentidos e significados desses programas na internet. Suponho que
ainda seja precoce levantar conclusões, mesmo que provisórias, mas um dos
diagnósticos a ser investigado é por que procurar tais programas e não
profissionais de saúde", disse Ligia à Agência FAPESP.
Segundo o estudo,
publicado em artigo na revista Physis, Revista de Saúde Coletiva, a mudança de
paradigma em relação aos programas de reeducação alimentar – a reeducação no
lugar da "dieta rígida, monótona e rigorosa" – precisa ser mais bem avaliada.
O estudo selecionou
seis sites conhecidos, a partir de uma amostra de 336 relacionados a programas
de emagrecimento disponíveis no Brasil, durante um período de dois meses. Os
sites analisados (Cyberdiet, Emagrecendo, Perca Gordura, Sempre em Forma, Good
Light e Dieta Diet) foram divididos em duas categorias: de conteúdos abertos e
de conteúdos fechados, só para assinantes.
Em ambos os grupos,
foram analisadas imagens, receitas, reportagens depoimentos e outros aspectos.
De acordo com Ligia, os sites abertos usavam uma estratégia bastante utilizada
nas revistas femininas, em que "personalidades funcionam como identificação e
projeção, servindo de estímulo ao público".
"Uma segunda estratégia
é a do 'antes e depois', que tem o intuito de demonstrar os resultados do
programa. É um recurso de colocar 'gente como a gente', o que traz maior
identificação com o público. Com as tecnologias da informática, muitos sites
sobrepõem fotos, alternando as imagens do antes e depois do emagrecimento, em um
jogo visual que pode causar importante impacto em usuários potenciais",
destacou.
Esses sites oferecem
muitos textos, reportagens e dicas sobre diferentes temas, do tipo propriedades
dos alimentos, alimentação e dieta, dicas do que fazer quando sentir fome,
orientações sobre atividades físicas e cálculo do índice de massa corporal, que
é um dos primeiros elementos visualizados nas páginas.
Já os de conteúdo
fechado oferecem também espaços para compras de produtos, livros e visualização
do progresso da dieta. Os usuários têm um canal exclusivo de e-mail, além de
chat e telefone (com horários preestabelecidos). Especialistas em nutrição,
atividade física e psicologia ficam à disposição dos usuários.
"Os depoimentos
publicados nos sites atribuem permanentemente uma situação de conforto e apoio
por meio desses profissionais. Trata-se de uma relação paradoxal, na qual se
sabe que há alguém constantemente presente, mas não se conhece quem está
controlando e auxiliando no processo", disse a pesquisadora.
Gastronomia e ciências da nutrição
De acordo com a pesquisa, os múltiplos discursos na internet relacionados à dieta não se afastam dos discursos médico-nutricionais e a referência à dieta hipocalórica e hipolipídica não parece ser contestada. Os textos são reelaborados, buscando elementos da vida cotidiana dos sujeitos para consubstanciá-los dentro da lógica publicitária.
Foi observada uma
mudança de concepção nas tentativas de criar estratégias educacionais. O "fazer
dieta" vem cedendo espaço para o "comer de tudo sem passar fome". A gastronomia
entra, segundo Ligia, como "elo importante do resgate do prazer em comer, ao
estabelecer uma aliança com as ciências da nutrição".
"O gosto é um dos
aspectos mais subversivos do corpo, o direito ao prazer é uma espécie de
reivindicação silenciosa do corpo e sobre isso a nutrição precisa pensar junto
com a gastronomia. As ciências da nutrição, no bojo da sua história,
secundarizaram o prazer – um importante objeto da gastronomia – em prol da
saúde. Isso está sendo paulatinamente revisto", disse, enfatizando em seguida o
caráter ainda preliminar do estudo.
"Comer é muito mais do
que a ingestão de nutrientes para garantir a funcionalidade do organismo na
preservação e promoção da saúde. Trata-se de uma prática cultural, construída e
ao mesmo tempo construtora de identidades, uma forma de sociabilidade e de
prazer. O projeto da ciência em transformar o comer em apenas nutrir o corpo não
tem funcionado e a resposta vem dos próprios sujeitos", afirmou a autora.
Para ler o artigo Os programas de emagrecimento na internet: um estudo exploratório, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui.