Certamente, os sentimentos relativos aos estímulos advindos dessas manifestações externas e dos organismos multilaterais vão do orgulho à admiração e passam pela valorização da identidade nacional. Entretanto, é no mínimo curioso observar que o agronegócio brasileiro, protagonista da admirada performance de nossa economia, não tenha semelhante reconhecimento da própria sociedade do País, em especial a população das grandes cidades.
Tal fenômeno, quase uma ironia, talvez se deva ao fato de o setor ter-se acostumado a falar em números, mas cometendo o pecado de não os traduzir publicamente de maneira clara: 27% do PIB nacional, 37% dos empregos existentes em todo o Brasil, 42% das exportações, 215 mercados conquistados, terceiro exportador mundial, 84% de ganho de produtividade na soja desde o início da década de 90, 122% no milho, 950% de crescimento das exportações de carne de frango no mesmo período, mais de 80 milhões de toneladas de dióxido de carbono retirados da atmosfera desde o início da produção dos carros flex, em 2003...
Tudo isso impressiona, sem dúvida, mas não parece ser suficiente para estabelecer uma conexão com o cotidiano das pessoas. Tal descompasso reflete grave falta de comunicação, amplificada pela conotação quase pejorativa dada ao termo “agronegócio”, importado ao Brasil desde a Universidade de Havard, nos Estados Unidos, por lideranças como Roberto Rodrigues e Ney Bittencourt de Araújo, com um intuito nobre e importante: demonstrar a interdependência dos elos que compõem o setor, de maneira a potencializar a atividade e melhorar os processos da gestão e qualidade, com benefícios a todos.
Atualmente, como seria possível, sem uma visão sistêmica, cumprir as exigências de um consumidor, a cada dia mais informado, que quer saber com precisão como o alimento levado à sua mesa foi produzido e quais as práticas utilizadas? O termo trouxe organização, articulação e ganhos de diversas naturezas, mas é equivocado no modo de interagir com a sociedade, como se fosse um negócio à parte e não a própria economia brasileira, atualmente tão festejada. Até porque, por trás da agricultura brasileira há muito investimento em pesquisa, tecnologia, capacitação profissional, respeito ao meio ambiente e, acima de tudo, há a consciência de que o alimento é importante para a vida. Prova disso, só para dar dois exemplos, está nas cadeias produtivas que vai do algodão à camiseta, e da carne e do leite que integram a segurança alimentar.
Além disso, é muito possível que o próprio termo “negócio” não seja o mais adequado ao Brasil, por razões culturais. Voltando à questão dos números, estes devem ser traduzidos em termos de benefícios à sociedade. Para ficar apenas nos exemplos apontados, a conquista de 215 mercados somente foi possível devido à qualidade e atributos socioambientais dos nossos produtos do agronegócio, que nos habilitam a entrar nos mercados mais exigentes. Estar entre os três maiores exportadores mundiais do setor significa preços competitivos e que beneficiam, em primeiro lugar, a população brasileira. Ser o mais eficiente em etanol e gerar combustível renovável pela queima do bagaço da cana-de-açúcar são grandes contribuições para um país ecologicamente melhor e cada vez mais independente em termos energéticos.
Os ganhos de produtividade garantem abastecimento, preços equilibrados e estabilidade econômica e política ao Brasil, além de apontarem soluções exequíveis para o mundo, em termos de segurança alimentar e energética. Portanto, é hora de fazer justiça ao agronegócio nacional no plano da comunicação, tornando evidente para toda a sociedade a verdadeira identidade do setor, essência de um país cuja economia brotou na terra.
*João Guilherme Sabino Ometto, engenheiro (EESC/USP), é presidente do Grupo São Martinho e vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).