Ministro Sergey Lavrov: “Um erro, não um desastre”

É, mas...

Eis o que disse Lavrov hoje, depois de o Irã ter sido “desconvidado” para Genebra-2:

Foi um erro, mas não um desastre.

Disse também que:

(...) o Irã havia sido “desconvidado” por dizer exatamente o que a Rússia diz: que não é verdade que Genebra-1 tenha de ser “interpretada” como se tivesse já decidido que Assad “tem de sair”.

E acrescentou:

E agora? Será que, na sequência, vão “desconvidar” também a Rússia? É loucura.

Eh... Lamento, amigos, mas a Rússia pisou no tomate. Pisou feio no tomate. Explico por quê:

Sergey Lavrov - Ministro de Relações Exteriores da Rússia 

Erro lógico:

Primeiro, o que são “negociações”? São discussões entre duas ou mais partes. Nesse caso, há realmente duas partes: a parte pró-Assad e a parte anti-Assad. Pois bem. E desde quando uma das partes decide quem se inclui e quem não se inclui na outra parte? Se a parte anti-Assad diz que o Irã não é convidado, por que a parte pró-Assad não exigiu que a França fosse também “desconvidada”, sob o argumento de que o Ministro de Relações Exteriores da França, Laurent Fabius, declarou que Assad não merece viver no planeta Terra?

Erro tático:

Segundo, não pode haver dúvidas de que o lado pró-Assad está vencendo a guerra. Assim sendo, por que o lado perdedor ainda está definindo as regras?! No mínimo, deveria ser o contrário. Se o lado perdedor está definindo termos tão absurdamente ultrajantes, é claro que o lado que está vencendo a guerra teria de simplesmente rejeitar tudo e deixar a reunião. Ao aceitar os termos atuais, o lado pró-Assad age como se estivesse perdendo a guerra.

Erro político:

Terceiro, agora que as forças pró-Assad aceitaram esse “tapa na cara” sem qualquer reação, as forças anti-Assad serão encorajadas a nada ceder. Negociação que começa assim não pode terminar em acordo. Por que o lado anti-Assad cederia alguma coisa, adiante, se já tem reconhecida sua posição de nada ceder? O lado anti-Assad, daqui em diante, só exigirá, exigirá e exigirá.

Erro moral:

Quarto, o Irã tem pleno, integral, inegável direito de sentar-se àquela mesa. A ética e a moral têm de contar, se não para os sionistas doidos e os anglos, pelo menos para a Resistência. O Irã lutou para proteger a Síria, iranianos morreram para defender os sírios dos répteis wahhabistas. O Irã defendeu a Síria quando ninguém mais teve coragem de se opor abertamente à constelação terrorista internacional que a imprensa-empresa global chama de “oposição” a Assad. Como admitir que Rússia e Síria afastem-se do Irã, depois do papel crucial que o Irã desempenhou na aliança sírio-iraniano-russa? Como sírios e russo podem admitir que Indonésia ou Brasil participem de Genebra-2... mas não o Irã? Não é coisa que se faça a aliados. Não é decente. Minha opinião.

Erro diplomático:

Quinto e último, considerando que a tal conferência começa desse modo absurdo, é praticamente certo que fracassará. De fato, acho muito melhor que fracasse, porque o fracasso dessa conferência pode ser usado para provar que a presença do Irã é absolutamente indispensável para qualquer acordo. E aí começará o jogo de empurra-empurra das culpas, de um lado para o outro.

Se Síria e Rússia se tivessem retirado, se nem aparecessem lá, em solidariedade ao Irã, se tivessem tentado pelo menos começar a argumentar, a culpa cairia integralmente sobre os doidos norte-americanos e suas exigências doidas. Em vez disso, os EUA conseguem sabotar a conferência e escapar, como se nada tivesse acontecido.

E agora? O que virá agora?

Bósnia redux

Tudo leva a crer que nem Síria nem Rússia se retirarão da “conferência”.

Sinceramente: minha melhor esperança, agora, é um amplo, vasto fracasso da “conferência”, porque prefiro acordo nenhum, que acordo que perca todas as vantagens que o exército sírio asseguraram ao preço do sangue e da vida de seus soldados. Infelizmente, Само слога  Србина  спасава  (Samo sloga Srbina spasava), que se pode traduzir como “só a unidade salvará os sérvios”.

Agora começará a pressão para qualquer acordo, algum tipo de qualquer coisa que se assemelhe a acordo: é outra vez a Bósnia, e todos sabemos como terminou da primeira vez; os sérvios venceram a guerra, os muçulmanos recusaram-se a negociar de boa fé e veio a intervenção dos EUA. Mas, mais importante: os anglo-sionistas conseguiram dividir os sérvios em vários grupos. Primeiro, Milosevic apunhalou pelas costas os bósnios-sérvios e aceitou ajudar o bloqueio contra eles. Depois, dentro da Bósnia, as chamadas “forças federais” ou foram retiradas ou aceitaram depor as armas sob controle da ONU. Depois, os sérvios de Krajinas na Croácia foram convencidos de que a questão deles era separada da questão dos sérvios bósnios; e assim, tendo lindamente os feito rachar, EUA e OTAN atacaram todos eles.  Todos os sérvios haviam esquecido, naquele momento, o significado de seu principal símbolo, os “quatro Ss”.

Os “Quatro Ss” 
 Само слога Србина спасава

A força da aliança Hezbollah-Síria-Irã-Rússia está também na unidade. Essa unidade derrotou os wahhabistas em al-Qusayr. Essa unidade impediu o ataque já iminente dos EUA à Síria. Agora, essa unidade está comprometida, se não fundamentalmente, pelo menos externamente.

Não e não. Rússia e Síria cometeram erro gigantesco ao aceitar essa afronta de última hora, vinda do campo anti-Assad e de seu fantoche na ONU. Usando as palavras de Lavrov, acho que agir com tão absoluta e temerária arrogância também é erro, não desastre. Mas acrescento que há um desastre à vista, na ordem do dia. Nada que preste poderá brotar de Genebra-2.

[assina] The Saker

21/1/2014, The Saker,  The Vineyard of the Saker
Foreign Minister Lavrov – “A mistake - but not a disaster”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
 

http://redecastorphoto.blogspot.com.br

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