Protógenes abre o jogo sobre a corrupçãp de Fernando Henrique Cardoso, "o sociólogo"

O delegado Protógenes Queiroz deu uma longa entrevista à revista Caros Amigos que está nas bancas agora. Nela, o delegado fala de sua carreira, da Satiagraha, mas também do passado – do seu passado e do de outras personalidades de nossa história, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que estaria envolvido em um caso escabroso de corrupção.

Abaixo, reproduzo trecho da revista que trata desse caso de FHC, mas você deve ir a uma banca de jornal e comprar seu exemplar, porque a entrevista é longa, há denúncias contra um neto de Jorge "Essa Raça" Bornhausem, Paulo Maluf, Pitta etc., além de outros artigos que valem a leitura. MYLTON SEVERIANO - Fim da ditadura.
PROTÓGENES - E transição para o regime civil. José Sarney pega o país em frangalhos, devendo até a alma, sem dinheiro para financiar as contas públicas, muito menos honrar compromissos, a famige­rada dívida com o FMI. Havia até o "decrete-se a moratória". Era o papo nosso, da esquerda, dos estudantes, "não vamos pagar, já levaram tudo". E o Sarney, o que faz? Bota a mão na ma­nivela e nossos títulos da dívida externa valiam, no mercado internacional, no máximo 20% do valor de face, era negociado na bolsa de Nova York. No paralelo valiam 1%. O que significa? Não passa pela bolsa. Comprei, quero me livrar, então 1% do valor de face, título de um país "à beira de uma convulsão social, ninguém sabe o que vai acontecer com aquele país, um conjunto de raças da pior espécie": essa, a visão primeiro­mundista, o que representávamos para os ban­queiros. Escória. E aqui estávamos, discutindo a reconstrução do país. Vamos dialogar, botar os partidos para funcionar, eleições, e o Sar­ney tendo que dar uma solução. Fecha a mani­vela e toca a jogar título no mercado de Nova York. Cada título que valia 10%, 15%, mandava dinheiro aqui para dentro. Seis anos depois, o mercado financeiro internacional detectou que no Brasil haveria desordem, até guerra civil, e eles não iam receber o que tinham colocado aqui com a compra dos papéis podres, queriam receber mesmo os 15%. E fazem uma regrinha de três e colocam para o Banco Central: "Você vai instituir uma norma, os títulos da dívida ex­terna brasileira adquiridos no mercado finan­ceiro internacional, no nacional poderão ser convertidos junto ao Banco Central pelo valor de face desde que esse dinheiro seja investido em empresas brasileiras." Bacana, não? Se fun­cionasse como ficou estabelecido, nosso país se­ria uma potência, não? Ainda que uma norma perfeita, acho um critério não normal, não é? Não é moralmente ético eu comprar um título por 15% e ter um lucro de 100%, em tão pou­co tempo. Mas enquanto regra de mercado fi­nanceiro tenho de admitir que sou devedor. Se vendi a 15%, na bolsa, assumi o risco de, no fu­turo, o lucro ser maior para o credor. Tenho que pagar. Foi assim que foi feito? Não. Será que o grupo Votorantim recebeu algum dinhei­ro convertido? Alguma outra empresa nacional do porte recebeu? Não. O que o sistema mon­tou? Uma grande operação em determi­nado período para sangrar as reservas do país, e ainda tinha as cartas de inten­ção, que diziam "se você não me pagar posso explorar o subsolo de 50 mil qui­lômetros da Amazônia".

WAGNER NABUCO - Era a fiança?
PROTÓGENES - Sim. Então me deparo com um ban­co, o Paribas, hoje BNP-Paribas que se uniu ao National de Paris. Com três diretores, em São Paulo, e dois outros, mais um contador que foi assassinado e um laranja que se chamava Alberto. O banco adquire esses títulos, no va­lor de 20 milhões de dólares, não é? E converte no Banco Central e aplica em empresas brasileiras, empresas-laran­ja. Comprou no paralelo a 1 %, eram 200 mil dólares, e converteu a 20 mi­lhões de dólares aqui no Brasil e colo­cou nessa empresa-laranja...

MYLTON SEVERIANO Empresa de quê?
PROTÓGENES - De participações. Chamava-se Al­berto Participações, com capital so­cial de 10 mil reais. Já tem coisa erra­da. Como uma empresa com capital de 10 mil reais pode receber um investi­mento estrangeiro da ordem de 20 mi­lhões? Cadê o patrimônio da empresa? Como é que o Banco Central aprova? Mando pegar o processo. Ela investiu, vamos ver aon­de o dinheiro vai. Converteu os 20 milhões e ao longo de doze meses o dinheiro é sacado mensalmente na boca do caixa em uma conta e convertido no dólar paralelo e enviado para a matriz em Paris. Eu digo "Banco Central, me dá o processo do Paribas". Aí não consi­go, quem consegue é o procurador que tra­balhava comigo, Luiz Francisco. Consegue e remete pra mim em São Paulo. Vejo que no Banco Central houve uma briga interna pela conversão. Os técnicos se indignaram, e inde­feriram. Aí houve uma gestão forte para que houvesse a conversão. De quem? Do ministro da fazenda. Que era quem?

MYLTON SEVERIANO - Fernando.
MARCOS ZIBORDI - Henrique.
MYLTON SEVERIANO - Cardoso.
PROTÓGENES - Tento localizar os banqueiros. Todos fugi­ram. Os franceses todos. O contador, assassina­do. O laranja Alberto morreu de morte natural, enquanto nós estudantes lutávamos, dizíamos que a dívida externa não existia, e, de fato, par­te dela era artificial. A coisa é grave, vamos fa­zer uma continha, nós contribuintes, que cre­mos que existe uma ordem no país. Títulos que adquiri por 200 mil, converti no Brasil os 20 milhões de dólares, quanto tive de lucro? 19 milhões e 800 mil. Vamos fazer essa continha para vocês dormirem direito hoje. Esses 19 mi­lhões mandei para minha matriz, o papel está na minha mão ainda, porque dizia o seguinte a norma do Banco Central: ao converter esse tí­tulo, invista em empresa brasileira, e ao final de doze anos "Brasil, mostre a sua cara e me pague aqui, você me deve, pois sou credor des­sa nota promissória chamada título da dívida externa brasileira". Está na lei. Bota aí. Soma 20 milhões com 19 milhões e 800 mil: 39 mi­lhões e 800 mil. Nós devemos isso aí? E mais, o que pedi? Que o juiz bloqueasse o título do Paribas, não pagasse, indiciei os diretores. Por quê? Porque estava se aproximando o final dos doze anos, o título estava vencendo e tínhamos que pagar. Pedi que o Banco Central enviasse cópia de todos os processos de conversão da dí­vida externa brasileira pra mim. Estou esperan­do até hoje. Sabe o que o Banco Central falou? "O departamento não existe, nunca existiu, era feito por uma seção aleatoriamente lá no Banco Central." Então nós não devemos esse montan­te de milhões que cobram.

RENATO POMPEU - Só não entendi o que o Fernando Henrique Cardoso ganhou com isso.
PROTÓGENES - Calma, calma. Sobrou uma para contar a his­tória. A Célia da Avenida São Luís. A mulher de verdade. Era companheira do Alberto, ex-embai­xador do Brasil no Líbano. Quando estourou a guerra ele fugiu e viveu na França, estudando na Sorbonne. Quem ele conhece lá?

MYLTON SEVERIANO - Fernandinho.
PROTÓGENES - Colegas de faculdade. A Célia, marquei de­poimento numa quinta, véspera de feriado, às seis da tarde na superintendência da Polícia Federal. Uma morena bonita, quase 60 anos, me disse que tinha sido miss, modelo, era só­cia nessa empresa, tinha tipo 1 %. Furiosa, "que absurdo, véspera de feriado, perder meus negó­cios, engarrafamento". Já estava gritando no corredor. Dei um molho de uns trinta minutos até ela se acalmar. Pensei "essa mulher está fu­riosa e tem culpa no cartório". Falei "obriga­do por ter vindo", e ela "obrigado nada, o se­nhor é indelicado, desumano, sou dona de uma indústria de sorvetes, e me chama numa hora importante porque tenho que distribuir sorve­te, é feriado, o senhor não tem coração". No meio da esculhambação, digo "tenho que cum­prir meu dever, sou funcionário público", e ela "aposto que é o caso daquele Paribas, não sei por que ficam me chamando, e tem mais, fui companheira do Alberto, e ele foi muito mais brasileiro que muita gente. Era digno, hones­to, ficam manchando a alma dele. Eu ajudei ele até o fim da vida, inclusive sustentei parte da família dele". Percebi que não sabia a verdade, ela disse "ele morreu pobre, ficou esperando a conversão dessa dívida que nunca houve". De­talhe: na quebra de sigilo bancário encontrei um cheque do Alberto que ele recebeu, 64 mi­lhões, na boca do caixa do banco Safra. E ele transfere as cotas para uma empresa criada pelo Paribas em nome dos diretores.

MYLTON SEVERIANO - No Brasil?
PROTÓGENES - Já é um Paribas do Brasil. Transfere para a subsidiária, e os diretores começam a sa­car. O primeiro quem recebe é ele, valor equi­valente a 5%. E ela disse "ele não recebeu a comissão dele que era de 5%". Bateu! Tran­quei o gabinete, falei "vou mostrar um do­cumento, mas se disser que mostrei, pren­do a senhora", era a cópia do cheque, com assinatura e data. A mulher começou a cho­rar. "Desgraçado. Que o inferno o acolha!" Ela disse "tenho muito documento na minha casa". Se fizesse pedido de busca e apreensão chamaria atenção da Justiça, teria um inde­ferimento. Essa investigação estava sendo arrastada. Fiz uma busca e apreensão ao in­verso, "a senhora permite que selecione o que quero?", ela disse "perfeito". Naquela véspera de feriado, peguei dois agentes, con­trariando colegas que queriam ir embora...

MYLTON SEVERIANO - Qual o ano?
PROTÓGENES - 2002. Saímos de lá de madrugada, era um apartamento antigo, magnífico. Ela cho­rando, "desgraçado, até comida na boca eu dei". Ela me dá uma agenda, "aqui parecia o Banco Central, eu atendia o doutor Alberto, da área internacional". Encontrei documen­tos, agendas que vinculavam ele ao Armínio Fraga, ao Fernando Henrique, inclusive uma carta manuscrita, não vou falar de quem, de­pois confirmada, ela falou "levei esse presen­te, pessoalmente, até a casa do Fernando". Mandei documentos para perícia. Na época era eleição do Fernando Henrique.

RENATO POMPEU - Não, do Lula.
PROTÓGENES - Isso. Lula venceu contra Serra. Fernando Henrique era presidente.

RENATO POMPEU - Ele recebeu dinheiro então?
PROTÓGENES - Vamos pegar a linha do tempo. Ele sai de ministro da Fazenda e vira presidente. O ge­rente da área internacional que dá o parecer no processo, quem era? Armínio Fraga. Que presidiu o Banco Central. Essa investigação não sei que fim deu. Pedi ao Banco Central o bloqueio de todos os títulos da dívida externa brasileira que foram convertidos. E pedi cópia de todos os processos de conversão junto ao Banco Central para investigação.

RENATO POMPEU - Saiu na mídia?
PROTÓGENES - Em parte, mas foi abafado. Quem conseguiu publicar foi, se não me engano, a Época.

PALMÉRIO DÓRIA - Citando Fernando Henrique?
PROTÓGENES - Não, não citou. A reportagem era "Fraude à francesa". Essa investigação surge da denúncia de um advogado, Marcos Davi de Figueiredo. Ele sofre uma pressão implacável dentro do ban­co. A Célia passa a ser ameaçada, logo que pres­ta depoimento entregando tudo. Inclusive os es­critórios que deram suporte a essa operação, um do Pinheiro Neto, e ela diz que sofria ameaça do próprio Pinheiro Neto. O procurador foi o dou­tor Kleber Uemura.

MARCOS ZIBOROI - É a última notícia?
PROTÓGENES - Sim. Parece que ele tinha conseguido a que­bra de sigilo bancário. Depois o dinheiro saiu no mercado paralelo e entraram grandes empresas com esquemas de saída de dinheiro. Tinha a Co­tia Trading, que tinha uma coisa com a Volkswa­gen. Entra gente muito poderosa no esquema. Pedi a quebra de sigilo de todas as pessoas que participaram da fraude. E o Kleber conseguiu, aí não acompanhei mais. O Tribunal Federal deu a decisão de que era para não ter quebra de sigilo, era a juíza, salvo engano, Sylvia Steiner. Dá de­cisão favorável ao banco. Meses depois é nomea­da juíza do Tribunal Penal Internacional pelo...

RENATO POMPEU - ... excelentíssimo presidente da República.

Pergunto a você que me lê: Nossa grande imprensa vai repercutir a entrevista? Será que o senador campeão do Congresso em Foco, Álvaro Dias, vai encomendar à Veja uma reportagem?

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