Começa a tomar forma a primeira Conferência Nacional de Comunicação, reivindicação histórica dos movimentos pela democratização da comunicação. Na última sexta-feira (6), a Comissão Nacional Pró-Conferência deliberou quais entidades serão indicadas para integrar a organização do evento. Entre elas está o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), um dos principais atores na mobilização pela Conferência. A nominata será apresentada nesta terça-feira (10/02) em reunião com o Ministério das Comunicações (Minicom).
Além do FNDC serão indicados o Conselho Federal de Psicologia (CFP), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitárias (Abraço), a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), o Coletivo Intervozes de Comunicação, a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Radiodifusão e Televisão (Fitert) e o Movimento Negro Unificado, entre outras entidades. A Comissão irá sugerir como tema central para o debate na Conferência a idéia de que "as comunicações são meios para a construção dos direitos e da cidadania".
A realização da Conferência
está prevista para os dias 1º, 2 e 3 de dezembro de 2009. As fases municipais
serão feitas até 22 de junho e as etapas estaduais de 30 de junho a 15 de
setembro. Até outubro serão sistematizadas as propostas. O Executivo
comprometeu-se em publicar ainda neste mês o decreto convocando a Conferência e
a portaria que designará a Comissão Organizadora. A data escolhida para a
Conferência refere-se ao Encontro Pró-Conferência Nacional de Comunicação,
realizado no ano passado, e aos dois anos de implantação das TVs Pública e
Digital no Brasil.
A definição do cronograma foi feita na última
terça-feira,3, quando representantes da Comissão Nacional Pró-Conferência
reuniram-se com André Barbosa, assessor da Casa Civil para assuntos de Ciência e
Tecnologia, Marcelo Bechara, assessor Jurídico do Minicom, Gerson Luiz de
Almeida Silva, secretário Nacional de Articulação Social da Presidência, Diogo
Santana, assessor da Casa Civil e Sylvio Kelsen Coelho, assessor da Secretaria
de Comunicação Social.
Participaram ainda a deputada federal Luiza
Erundina (PSB-SP), Jeronimo Guedes, representando o deputado Walter Pinheiro
(PT-BA); Márcio Araújo, assessor da Comissão de Direitos Humanos e Minorias
(CDHM) e Luiz Liñares, pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e
Informática (CCTCI). A confirmação da Conferência foi feita pelo Presidente
Lula, durante o Fórum Social Mundial, em Belém.
Para Roseli Goffman,
Coordenadora de Mobilização da Executiva do FNDC e representante do Fórum e do
CFP na Comissão Pró-Conferência, o próximo passo é buscar junto ao Executivo
"que a Comissão Organizadora seja plural e democrática para garantir esse
caráter também à Conferência". O FNDC defende a realização de uma Conferência
tripartite, com a participação da sociedade e movimentos sociais, das empresas
de comunicação e do Executivo.
Confirmação mobiliza
FNDC
A confirmação da Conferência determinou mobilização das
entidades nacionais e comitê regionais integrantes do FNDC, que se movimentam
para defender um formato democrático. Conforme o presidente da Federação
Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sérgio Murillo, a convocação resulta da
pressão dos movimentos sociais que, apesar da ambigüidade do governo e da clara
contrariedade de alguns setores, lutam por ela há muito tempo.
Ele
destaca a atuação do FNDC nessa mobilização e espera que a Conferência siga os
moldes propostos pelo Fórum, conforme apontam as resoluções da última Plenária
da entidade (confira aqui). O ponto central, segundo ele, deve ser o
envolvimento de toda sociedade para a construção de políticas públicas de
comunicação. "Normalmente, esse debate é controlado por setores burocráticos do
governo, pelo empresariado e pelo parlamento com participação bastante reduzida.
A grande novidade é que a Conferência pode assegurar nessa discussão a
participação social", afirma.
Coordenadora do Comitê Regional do Rio
Grande do Sul, a pedagoga Cláudia Cardoso, se disse surpresa com o anúncio da
Conferência. "Mas uma surpresa muito agradável. Acho que realmente o presidente
Lula ouviu o clamor da sociedade. Fomos ouvidos, depois de quase dois anos de
reuniões, de debates", afirma.
Cláudia espera ver na Conferência o
debate sobre uma nova comunicação, abordando todas as transformações que o setor
vem passando nos últimos 15 anos. "Se a gente conseguir debater isso, mostrar
como a nossa legislação é anacrônica, atrasada, e tentar atualizá-la, sairemos
felizes. Precisamos mostrar novos caminhos, um novo marco regulatório, um novo
marco filosófico da comunicação no país, privilegiando a informação como um
direito", defende.
Segundo a coordenadora, o Comitê gaúcho deve realizar
encontros e seminários preparatórios para a Conferência. "O FNDC tem
conhecimento, tem história, tem acúmulo para mostrar porque temos que discutir
comunicação, qual é a importância dela no dia-a-dia das pessoas, o que ela
define, o que ela não define. O FNDC pode oferecer para a sociedade brasileira
uma discussão qualificada de porque discutir comunicação no país",
afirma.
Reconhecer o processo em curso Na opinião de Rosane Bertotti,
secretária nacional de comunicação da CUT, a realização da Conferência
representa "uma conquista da nossa capacidade de argumentação e negociação. A
partir do momento que o governo Lula diz que vai chamar a Conferência ele está
reconhecendo a luta dos movimentos sociais". Para ela, é preciso reconhecer o
processo já construído e tê-lo como subsídio.
"A Conferência tem como
tarefa fazer uma analise geral da realidade da comunicação no país, e a partir
daí, produzir novas propostas, novas políticas públicas e reformular o marco
regulatório das comunicações", sustenta. Rosane ressalta ainda a importância do
envolvimento dos governos municipais e estaduais para garantir o caráter
democrático e massivo da Conferência. De acordo com a sindicalista, a CUT
pretende fazer um grande debate sobre comunicação com os seus
sindicatos.
A necessária participação dos setores público, privado e
estatal no âmbito da comunicação também é destacada por Jonicael Cedraz,
coordenador do Comitê FNDC da Bahia. "Vamos sentar juntos, os representantes dos
poderes legislativo, executivo, os empresários e o nosso campo da sociedade
civil para definir como garantir à sociedade brasileira, nos seus diferenciais,
nos seus limites e contradições, práticas de comunicação democráticas",
observa.
Para Jonicael, a Conferência deve ter como foco principal a
formulação de um novo marco regulatório, mas para isso também deve garantir que
campos como o da educação sejam representados. "Devemos pensar a realidade
brasileira, pensar a comunicação como uma forma de contribuir para a democracia
em todos os meios".
O coordenador baiano destaca a experiência do seu
estado, que realizou uma conferência estadual de comunicação como um momento
importante no país. No entanto, salienta que ela não deve ser tomada como base
para a Conferência Nacional, pois, além de ter tido um caráter estritamente
regional, "os movimentos sociais foram secundarizados nas discussões". A Bahia
deverá produzir novamente debates municipais e estaduais para se inserir na
etapa nacional.
Participação de setores
discriminados
De acordo com Sheila Tinoco, coordenadora de
Comunicação da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e
Ministério Público da União (Fenajufe), a Conferência responde ao clamor das
entidades identificadas com a luta pela por uma comunicação mais democrática,
tanto as diretamente ligadas ao setor como aquelas que incorporaram em suas
pautas a importância da comunicação para construção de uma sociedade
democrática. Para a Fenajufe, é fundamental também a participação de setores
discriminados na sociedade, como negros, homoafetivos, mulheres, portadores de
deficiências, trabalhadores sem-terras, sem-teto, entre outros.
Como
informa a coordenadora, a Fenajufe tem mobilizado seus sindicatos para a
realização da Conferência. A entidade realizou no ano passado um encontro
nacional sobre comunicação, firmando como resolução participar na luta nos
âmbitos nacional e estaduais.
Lidyane Ponciano, coordenadora do Comitê
mineiro do FNDC, ressalta que pela primeira vez a comunicação ganha destaque na
agenda política nacional. Mas ressalva que este é apenas o primeiro passo. "São
muitos os gargalos a tratar na Conferência e sabemos que os avanços serão a
passos lentos, mas pelo menos agora temos um espaço legítimo de
discussão".
A jornalista salienta a importância de debater a
democratização do conteúdo dos meios de comunicação. "O conteúdo deve ser
construído com a participação da sociedade. Temos o direito de opinar sobre qual
conteúdo queremos ter acesso, quem será o responsável por esse conteúdo e como
ele chegará aos nossos lares", diz.
Em Santa Catarina, Natércia Magaldi,
que coordena o Comitê catarinense do FNDC, vê o anúncio como um grande avanço.
Para a psicóloga, a primeira conferência sobre comunicação evidenciará quão
fundamental é para a democracia o direito à diferença, e às mais diversas fontes
de informação.
(Envolverde/Revista Fórum)