Marajó é um dos territórios mais pobres do Brasil e, apesar de ser desde 1989, ano da Constituição do Estado do Pará, uma Área de Proteção Ambiental, nenhuma ação efetiva para a gestão dessa APA e para a regularização fundiária da região jamais foi implementada. Desde 2010 organizações da sociedade civil vem trabalhando para a estruturação de um plano para elevar a região à categoria de “Reserva da Biosfera” a ser reconhecida pela UNESCO. O processo está em andamento e é coordenado pela ONG Instituto Peabiru em um programa chamado “Viva Marajó”.
O pesquisador João Meirelles, diretor do Peabiru e autor de diversos livros sobre a Amazônia, alerta que a ocupação desordenada dessa região vai afetar a vida de milhares de quilombolas, ribeirinhos e moradores do Marajó, e aponta a inexistência de Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) para expansão da monocultura de arroz no Marajó. Ele explica que o Marajó é a única área do Pará que não possui o Zoneamento Ecológico Econômico e a elaboração de um Plano de Manejo da APA seria o primeiro passo para se discutir a implantação de grandes projetos econômicos na região.
O tema está sendo alvo de debates no âmbito da Federação da Pecuária e da Agricultura do Pará, do Conselho do Agronegócio do Pará e da Secretaria de Estado da Agricultura, que na última desta terça-feira, 29 de janeiro, reuniram-se em Belém para debater o potencial econômico da produção de arroz irrigado no Marajó. Mas ficou fora da pauta as questões ambientais, fundiárias, sociais e de arqueologia que envolvem a atividade.
Está se formando em torno desse tema o duro jogo maniqueísta de “quem é contra joga a favor da fome e da pobreza” e que preservar a biodiversidade e a cultura local significa “condenar a população à miséria”. Não se discute um aspectos relativamente simples, que é cumprir a legislação ambiental e fundiária em uma região onde apenas 25% dos pouco mais de dez milhões de hectares é legalizada com títulos de propriedade e destinações públicas.
O que grupos ambientalistas e lideranças sociais do própria região defendem é que se faça a regularização fundiária da região, junto com um Zoneamento Ecológico Econômico para que se definam as áreas passiveis para a exploração agrícola e pecuária, não apenas pelos produtores de arroz, mas para qualquer atividade de impacto na região.
Algumas das principais questões sociais e culturais levantadas ambientalistas e lideranças sociais são:
- Saúde humana – o uso de agrotóxicos em larga escala, especialmente aqueles lançados por aviões, constitui-se em forte ameaça à saúde de crianças e idosos;
- Agravamento de risco de doenças – a presença de grandes áreas inundadas, inclusive em períodos de seca, no entorno de núcleos urbanos poderá resultar em aumento de insetos transmissores de doenças tropicais (dengue e malária, principalmente), o que precisa ser monitorado;
- Exclusão da participação local – A comunidade local está totalmente excluída. Os moradores das comunidades do entorno das fazendas de arrozeiros são afetados diretamente pelos empreendimentos e ninguém os ouviu!
- Comunidades Quilombolas – qualquer empreendimento de grande porte precisa ouvir as comunidades quilombolas do entorno;
- Patrimônio arqueológico – por lei, qualquer intervenção de grande porte precisa ser precedida de estudo sobre a existência de patrimônio arqueológico. A região do Marajó é considerada como uma das que possui maior patrimônio de artefatos de cerâmica do Brasil.
É simples, cumpra-se a lei e haverá espaço para todos. (Envolverde)
* Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde, passou por diversas redações da grande mídia paulista, como Agência Estado, Gazeta Mercantil, revistas IstoÉ e Exame. Desde 1998 dedica-se à cobertura de temas relacionados ao meio ambiente, educação, desenvolvimento sustentável e responsabilidade socioambiental empresarial.
(Agência Envolverde)