Nos últimos anos, a mensagem tornou-se clara: se as pessoas e as empresas não mudarem seu padrão de consumo e produção, o planeta terá um trágico futuro em um par de décadas
Nos últimos anos, a mensagem tornou-se clara: se as
pessoas e as empresas não mudarem seu padrão de consumo e produção, o planeta
terá um trágico futuro em um par de décadas. No plantel de debates
internacionais sobre mudanças climáticas, especialistas explicam que cada um tem
sua responsabilidade na construção de uma vida mais sustentável e menos danosa
para o resto do mundo.
Daí o conceito de consumidor consciente, como o
defendido pelo Instituto Akatu, que desde 2001 estimula o consumidor a perceber
o impacto de suas ações e valorize empresas que minimizem possíveis danos ao
meio-ambiente. Pela lógica da ação, pessoas melhor informadas e mais conscientes
passariam naturalmente a comprar produtos de empreendimentos sócio e
ambientalmente responsáveis. Estes, por sua vez, se destacariam no mercado,
forçando outras companhias a assumir a mesma postura.
"O consumo
consciente pode ser descrito como um exercício de alteridade e solidariedade, no
sentido de que trata de fazer do ato de consumo algo que considere os outros e
trabalhe em benefício dos outros", defende Helio Mattar, idealizador e
co-fundador do instituto.
Esse contexto ideal é defendido por expertos
como o presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social
(Idis), Marcos Kisil. Segundo ele, não resta dúvida que as práticas sociais e
ambientais do setor privado vêm também de fatores coercitivos, ocasionados por
uma adequação das empresas às demandas da população.
"O consumidor
brasileiro está, a cada dia, não apenas mais consciente de seus direitos mas
também do papel que cidadão e empresas devem desempenhar na sociedade, como
agentes pró-ativos do desenvolvimento", acredita Kisil.
O otimismo, no
entanto, é relativizado quando analisados levantamentos sobre o tema. O
Instituto Akatu divulgou, no ano passado, um estudo sobre como e por que os
brasileiros praticam o consumo consciente. Os resultados do levantamento
mostraram que, além do número de consumidores considerados engajados ter
diminuído, ainda existe divergência entre o que se postula como princípio e que
realmente se pratica. Isto é, a intenção não se reverte em atitude.
Na
época a explicação para o negativo diagnóstico dada por Mattar, era a de que o
conceito de consumo consciente ainda está em fase de transição e, assim, tende a
suscetibilidade de condutas e opiniões de contexto imediato. "Em 2003, quando
divulgamos a primeira pesquisa sobre o tema, havia o risco eminente do apagão,
por exemplo, o que determinou, entre outros fatores, novos comportamentos. Isso
diminuiu agora", avaliou.
Realizada entre setembro e outubro de 2006, a
sétima pesquisa realizada pelo instituto entrevistou 1.275 adultos de todas as
classes sociais residentes nas 11 principais cidades das cinco regiões
geográficas do país: Belém (PA), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), Curitiba
(PR), Fortaleza (CE), Goiânia (GO), Porto Alegre (RS), São Paulo (SP), Rio de
Janeiro (RJ), Salvador (BA) e Recife (PE). As distribuições de idade, sexo e
classe social, segundo o instituto, foram ponderadas em relação à distribuição
demográfica de cada um.
Por outro lado, o Ibope Inteligência entrevistou
537 executivos de 381 grandes empresas brasileiras para descobrir como eles
enxergam o conceito de sustentabilidade e quais as suas implicações no cotidiano
dessas organizações. Resultado: o setor privado incorporou valores inerentes aos
negócios sustentáveis, mas embora a intenção exista, ela ainda não se converte
em comportamento.
Por meio das respostas, foi possível detectar paradoxos
entre o que se entende como sustentável e o que realmente se faz para chegar a
esse fim, principalmente no que se traduz em questões estratégicas. Entre os
exemplos estão os quatro critérios para definir uma empresa como sustentável,
apontados na pesquisa. Nessa questão, 92% dos executivos concordaram que
preservar o meio ambiente é vital para o processo, seguido de contribuir para o
desenvolvimento econômico do Brasil (89%), investir em ações sociais (87%) e ter
sucesso em longo prazo (83%).
"O fato de um número tão alto concordar
nesses tópicos mostra que eles entendem o conceito de triple bottom line (que
designa o equilíbrio entre os três pilares - ambiental, econômico e social), que
está na base de todos os novos negócios", argumentou o CEO do Ibope
Inteligência, Nelsom Marangoni.
O responsável pela pesquisa, no entanto,
afirma que, na caracterização das empresas, os principais aspectos levantados
não estão diretamente relacionados à responsabilidade socioambiental. Os
entrevistados constataram como principais preocupações ser ética (que tem mais a
ver com práticas de combate ao preconceito e discriminação), em 80%, pagar
impostos (78%), respeitar os consumidores (73%) e cumprir as leis trabalhistas
(72%).
Para consultor de terceiro setor e responsabilidade social da
Ofício Plus Comunicação e publisher da revista Idéia Socialambiental, Ricardo
Voltolini, como se pode ver, são grandes os desafios de mobilizar os
brasileiros, "fazendo com que percebam o poder de influência que tem o consumo
consciente na mudança dos modelos de produção e estratégias de negócio", disse
em recente artigo, publicado no jornal Gazeta Mercantil.
Esse poder
existe, mas simplesmente não há conscientização sobre os danos ambientais, como
chegou a dizer a diretora executiva da organização The Trust for Civil Society
in Central and Eastern Europe, Rayna Gavrilova, na última edição da revista
inglesa Alliance. "Nenhuma família compraria uma lavadora de louças sem avaliar
como a sua presença afetaria o uso de espaço e a conta de eletricidade",
ironizou.
Embora a passos curtos, o Brasil avança na questão de um
consumo mais responsável e exigente. Não por acaso, o poder do consumidor será
objeto de atenção e curiosidade da população, que tende a exercê-lo cada vez
mais diretamente. Com certeza, um dos temas-chave de 2008.
Crédito de
imagem: ElzaFuizaABr
(Envolverde/Rede Gife)