Crise leva pessoas a morar em carros nos EUA

A cidade de Santa Bárbara se orgulha de seu estilo de vida tipicamente californiano, com praias, cafés e uma charmosa arquitetura de estilo espanhol.

É claro que tudo tem um preço robusto: localizadas entre as montanhas de Santa Ynez e o Oceano Pacífico, estão casas que valem milhões de dólares.

Mas, mesmo nesta ensolarada enseada de riquezas, muitos vivem longe do sonho norte-americano.

Em um estacionamento no lado oposto de uma rua de mansões luxuosas, a noite traz uma estranha visão.

Alguns carros chegam e estacionam nos cantos do terreno. Dentro de cada carro, mulheres, talvez alguns animais de estimação e malas cheias de coisas e roupas de cama.

A poucos metros de casas com quartos ociosos, estão os habitantes de Santa Bárbara que são obrigados a dormir em seus carros.

Sem-teto há pouco mais de um ano, eles são uma conseqüência direta do colapso do mercado imobiliário norte-americano.

Casas 4x4


Neste estacionamento apenas para mulheres, Bonnee (que revela apenas seu primeiro nome), usa um vestido azul e tem um comportamento de mulher de negócios.

Um ano atrás, ela vivia como, ironicamente, uma corretora de imóveis. Mas, quando as pessoas pararam de comprar casas, seu salário, baseado em comissões, secou e, como muitos clientes, ela não conseguiu pagar sua hipoteca.

De repente, ela se achou sem lugar para morar a não ser seu 4x4.

Pilhas de cobertores estão no porta-malas do veículo. Documentos pessoais estão nos compartimentos ao lado dos bancos. Uma caixa de maquiagem e uma carteirinha de uma academia de ginástica (onde ela toma banho) estão na frente. Com ela, constantemente, estão fotos de sua antiga vida.

Ela não consegue acreditar em sua situação.

"Meu Deus, o coração da América está sangrando", diz.

Lágrimas começam a sair de seus olhos.

"Eu sei que as coisas vão ficar melhores, mas é triste. Eu realmente lutei muito".

Um outro 4x4 entra no estacionamento e Barbara Harvey, de 67 anos, desce do carro.

Ela abre o porta-malas e dois grandes cães da raça golden retriever saem.

Barbara começa sua rotina noturna. Ela pega algumas de suas malas e tira um pijama e iogurtes (seu jantar). Ela então arruma cobertores na parte de trás do carro.

Barbara também costumava trabalhar com o financiamento de imóveis. Mas, desde abril, ela e seus cães, Ranger e Phoebe, passam todas as noites em seu carro. É apertado, mas ela diz que se ela dormir na diagonal, todos cabem dentro do veículo.

Nova tendência?


O estacionamento deixa as pessoas que dormem em carros entrarem a partir das 7h da noite, mas os banheiros públicos fecham com o pôr-do-sol.

Como resultado, Barbara diz que não bebe nenhum líquido depois que ela chega. De manhã, ela toma banho na casa de um amigo.

Vestida com roupas limpas e confortáveis e usando óculos escuros, ela não se parece em nada com o estereótipo do sem-teto.

"Vai começar a haver um monte de indivíduos que são de classe-média, mas que não podem comprar nada. Nós estamos em uma terrível confusão econômica. Acho que ainda não vimos nem metade do que vai acontecer com este país", diz Barbara.

Este novo fenômeno de sem-teto de classe média é difícil de quantificar, mas a New Beginnings, uma organização que cuida do sistema de estacionamentos-dormitórios em Santa Bárbara, diz que acomoda cerca de 55 pessoas em seis estacionamentos.

A assistente social Nancy Kapp, ela também uma ex-sem-teto, afirma que há uma lista de espera para espaço nestes estacionamentos e que ela recebe cada vez mais ligações de pessoas que estão para perder suas casas.

Ela diz que um novo tipo de sem-teto está surgindo nos EUA.

Pesadelo americano

"Ser pobre é como um câncer, agora este câncer está atingindo a classe-média", ela explica. "Não importa o quão forte você seja, é uma quebra na psique humana quando você começa a perder tudo que tem".

"Estas pessoas trabalharam a vida inteira para terem uma casa e agora tudo está desmoronando. Isto não é o sonho americano, é o pesadelo americano", diz Nancy.

Os preços de casas na Califórnia caíram 30% do início do ano até maio. Poucos lugares nos Estados Unidos foram tão atingidos.

Mas grupos imobiliários norte-americanos dizem que o aumento dos sem-teto nos EUA começou com o início da crise, no ano passado.

Vida em trailer

Em outro estacionamento em Santa Bárbara, Craig Miller, sua mulher Paige, e seus dois filhos dizem que se sentem apertados no pequeno trailer onde eles têm vivido por meses.

"É difícil manter as coisas limpas", diz Paige. "É difícil se sentir completo".

Originalmente da Flórida, a família cruzou os Estados Unidos para começar uma nova vida na Califórnia. Mas, incapazes de encontrar trabalho em tempo integral e incapazes de pagar aluguel, nas palavras de Craig, eles ficaram "presos".

Ele diz que, no início, era como férias, mas agora tudo está muito duro.

"Conseguir dinheiro para comida não é uma coisa na qual tínhamos que pensar antes", diz Miller.

"Nós esperamos conseguir sair daqui e conseguir um lugar para ficar. Estamos trabalhando duro para isso. Esta é apenas uma situação, não nosso destino".

Quando vai ficando escuro em Santa Bárbara, aqueles que dormem em carros se preparam para mais uma noite.

Mas todos precisam acordar cedo: não é permitido ficar lá depois das 7h da manhã.

Alguns trabalham, outros passam o dia dirigindo de um lugar para o outro.

Quando a noite cai de novo, eles voltam para o estacionamento.

Comparado com sem-teto de outros países e mesmo outros americanos, estes ainda têm sorte.

Mas se a crise econômica piorar, podem aparecer mais deles?
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