Muitos cientistas sociais dizem que as cidades latino-americanas passam por um momento de crise territorial, porém poucos são tão enfáticos sobre a dimensão do problema quanto o colombiano Emílio Pradilla Cobos.
"Numa perspectiva futura, até 2050 nenhuma cidade irá resolver seus problemas. Esta é uma das grandes tragédias das cidades latino-americanas causadas pelo neoliberalismo", declarou enfático para os alunos de arquitetura e urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) durante sua passagem por Florianópolis na última semana.
Ao fazer uma radiografia completa
da situação das metrópoles latino-americanas, que nas palavras dele possuem
tantas diferenças, ao mesmo tempo em que são muito semelhantes; Pradilla faz um
alerta especial ao limite ecológico que elas estão vivendo.
"São cidades
que cresceram em nichos ecológicos e não souberam resolver problemas como a
captação e o despejo da água. Não vou nem entrar no problema do lixo... Estamos
contaminando os lençóis freáticos e o solo e não temos uma solução possível em
vista", afirmou o urbanista, que é também professor visitante da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Esta crise permanente é causada pela
falta de uma política forte e de longo prazo para enfrentar todos estas questões
que, segundo ele, são apenas abrandadas a cada nova administração. Um exemplo
disso é o zigue-zague entre a construção de grandes vias e o pouco investimento
em transporte público.
Transporte e trânsito
O
urbanista explica que o apoio às indústrias automobilísticas é a primeira razão
para o forte investimento em obras multimilionárias, que atendem apenas 20% da
população. O esforço acaba sendo em vão, pois o ritmo de produção de automóveis
é muito mais intenso que a construção das vias que, por esta razão, se saturam
em poucos anos. "O governo nunca ganha a corrida dos automóveis",
enfatiza.
Para Pradilla, o modo como o problema do trânsito é enfrentado
deixa uma grande massa da população a mercê de um sistema de transporte público
deficiente e, no final das contas, não traz uma solução nem para os usários de
meios coletivos quanto para os proprietários de carros. "Isso sem falar na
questão ambiental causada pelo excesso de automóveis e congestionamentos",
ressalta.
Além disso, este modelo exclui o pedestre da vida urbana, com
destaca Pradilla, que não consegue ao menos atravessar a rua para comprar o pão,
correndo o risco de ser atropelado. "Isto criou cidades fragmentadas: são
pedaços de cidades de um lado e outras dentro de enormes muralhas de concreto",
declara.
Violência e empreendimentos privados
O
aumento da violência, gerado pela situação econômica, tem causado também um
forte processo de privatização dos espaços públicos. Centros comerciais
fechados, por exemplo, foram criados para atender todas as necessidades de
compra em um único lugar que possibilitasse o controle e a segurança (o que a
rua já não permite) e oferecesse estacionamento fácil e
seguro.
"Colocamos a rua dentro de um edifício, com polícia privada e um
grande estacionamento. Porém eles já não cumprem mais nenhuma das funções para o
qual foram criados e só serviram para privatizar o espaço",
comenta.
Pradilla afirma que todas as cidades na América Latina são
violentas neste momento, o que criou um imaginário coletivo permanente de
violência. "Nós achamos, a todo momento, que vamos ser seqüestrados. E realmente
somos", diz.
Isto é dos motivos para a constante segmentação da vida dos
habitantes em lugares privados que, para o urbanista, escapam justamente da
natureza da cidade que é criar conglomerados humanos. "Os espaços públicos são
meros resquícios e só servem para serem vistos dos carros. Não são vividos, não
são mais espaços de convivência", afirma.
O centro histórico, que antes
reunia a população por provir diferentes serviços, hoje é ocupado pelos setores
populares, que alimentam ali o setor informal da sociedade. Todos os outros
setores sociais vão sendo organizados para o motorista, na beira das grandes
avenidas, dando uma nova forma à cidade e ao modo como cresce.
Pradilla
integra uma rede de pesquisadores latino-americanos que estudam as metrópoles
latino-americanas, motivo pelo qual passou veio ao Brasil neste
mês.
Saiba mais
Artigo: A
corrida desigual entre automóveis e as novas vias urbanas , de Emílio Pradilla
Cobos - www.metropoli.org.mx
(em espanhol)
Artigo: Zona Metropolitana do Valle do
México: Da centralidade a rede de corredores terciários , de Emílio Pradilla
Cobos - www.observatoriodasmetropoles.ufrj.br/Pradilla.pdf (em
espanhol)
(Envolverde/Carbono Brasil)