Santiago, 01/04/2008 – O advogado da organização ambientalista norte-americana Natural Resource Defense Council (NRDC) Robert Kennedy está no Chile em apoio aos que se opõem à construção de cinco represas na Patagônia. Ontem, reuniu-se com a presidente Michelle Bachelet. Na entrevista de aproximadamente meia hora, o especialista, um dos filhos do assassinado senador Robert Francis Kennedy (1925-1968), ofereceu a Bachellet a assistência técnica da NRDC para desenvolver as energias renováveis não-convencionais (ERNC) no país, entre elas a eólica, solar, mini-hidráulica e maremotriz, bem com o contato com investidores estrangeiros.
A NRDC é uma das 45 organizações
locais, nacionais e internacionais que compõem o Conselho de Defesa da Patagônia
Chilena, nascido no ano passado para enfrentar o projeto da empresa HidroAysén
de construir cinco megacentrais hidrelétricas nos caudalosos rios Baker e Pascua
na austral região de Aysén. Os proprietários da companhia são a firma chilena
Colbún, com 49% das ações, e a multinacional Endesa, que investiriam US$ 3
bilhões no complexo para gerar 2.750 megawatts de eletricidade.
Kennedy
chegou há uma semana ao Chile para visitar pela sétima vez o rio Futaleufú, na
região de Los Lagos, sul do país, lugar do qual se declara apaixonado. Antes da
reunião com Bachelett, o advogado deu uma concorrida entrevista coletiva junto
com representantes locais do Conselho. "Se a Patagônia ficasse nos Estados
Unidos ou em qualquer outro país do mundo seria um parque protegido (pelo
Estado)", disse, após afirmar que espera que o projeto não seja construído por
"decisão política". "Se realmente houvesse conscientização no Chile, a ninguém
ocorreria construir represas em um lugar como esse", ressaltou o ativista, que
também se reuniu com o ministro de Energia do Chile, Marcelo Tokman.
Por
que destruir um tesouro nacional (com cinco represas que demorarão décadas para
serem construídas) quando se pode conseguir energia barata, eficiente e muito
mais rápido com as ERNC, perguntou Kennedy, para quem "é provável que o Chile
tenha o maior potencial do mundo para desenvolver as ERNC", devido à sua grande
diversidade geográfica. "Estive em muitos países e em nenhum há um lugar tão
lindo como a Patagônia chilena", disse o sobrinho de John F. Kennedy,
assassinado em 1963 antes de completar seu terceiro ano na presidência dos
Estados Unidos. A campanha desenvolvida pelo Conselho contra as cinco represas,
que inundarão quase seis mil hectares de terrenos virgens, tem diversas linhas
de ação.
Uma das mais agressivas é o desprestigio dos produtos chilenos
de exportação, como madeira, cobre e vinho, que tenham relação com a Endesa ou a
Colbún ou que possam se beneficiar da energia gerada pelas empresas. O último
anúncio do Conselho nesse sentido é o pedido que será feito às 50 maiores
empresas de materiais de construção dos Estados Unidos para que questionem os
produtos de madeira do grupo local Matte, controlador da Colbún. Além disso, a
organização norte-americana Jane Goodall coordena o envio de carta a
consumidores e estudantes desse país através da Internet para depreciar a imagem
das empresas por trás da HidroAysén. A campanha também teve a adesão de
artistas, como o cantor country Dana Lyons.
Na terça-feira da semana
passada, o gerente-geral da companhia, Hernán Salazar, se reuniu com
correspondentes da imprensa estrangeira em Santiago para explicar o lado
positivo que a seu ver tem o projeto. Segundo o executivo, as ERNC só podem
atender 10% ou 15% da geração elétrica do país e para conseguir a mesma
quantidade de megawatts que a HidroAysén são necessários entre 90 mil e cem mil
hectares com geradores eólicos e 175 minicentrais hidrelétricas com suas
respectivas linhas de alta tensão. Além disso, ressaltou que o Chile utiliza
menos de 25% de seu potencial hidrelétrico (4.832 de 20.323 megawatts) e que
Aysén, localizada a mais de dois mil quilômetros ao sul da capital, é a região
mais dotada neste sentido, com mais de oito mil megawatts possíveis de serem
gerados a partir da água.
Segundo cálculos da empresa, as cinco centrais
em plena operação representariam cerca de 20% do consumo energético do país. Por
outro lado, Salazar assegurou que o projeto equivale à construção de sete
centrais termoelétricas vapor-carvão, que, ao contrário das represas, emitem
dióxido de carbono (CO²) na atmosfera, portanto, com elas seria possível
substituir a emissão de 16 milhões de toneladas de CO² por ano. O executivou
informou, ainda, que entre 85% e 90% do estudo de impacto ambiental respectivo
está terminado e será apresentado no segundo semestre deste
ano.
Atualmente, a HidroAysén negocia com a empresa canadense Transelec
para que se responsabilize pela linha transmissora de dois mil quilômetros que
levará a eletricidade desde Aysén até Santiago, atravessando oito regiões do
país, um dos aspectos mais criticados pelos ambientalistas. Por motivos
técnicos, disse, a linha, que seria de corrente contínua, não pode ingressar em
outro ponto ao Sistema Interconectado Central (SIC), que abastece mais de 93% da
população chilena, desde a região de Atacama até a região de Los Lagos.
A
Transelec, disse Salazar, prepara um anteprojeto com um esboço dos locais onde
seriam instaladas as torres de alta tensão. Se a HidroAysén aprová-lo, a
Transelec devera apresentar por sua conta às autoridades um estudo de impacto
ambiental. Diante da arremetida na mídia do Conselho de Defesa da Patagônia
Chilena, Maria Irene Soto, assessora de comunicação da companhia, disse à IPS
que a empresa pretende responder apenas com "informação".
A discussão
sobre as centrais de Aysén têm como pano de fundo a escassez de energia que vive
o país, cujas autoridades não descartam um racionamento elétrico nos próximos
meses. O Chile importa 72% da energia que consome. Alguns dos fatores que
explicam este cenário são as restrições que desde 2004 sofre os envios de gás
natural desde a Argentina, os altos preços internacionais do petróleo e o
déficit de chuvas suportadas por este território desde o ano passado por causa
do fenômeno climático de La Nina.
Embora vários ministros chilenos tenham
se declarado partidários da construção das centrais, se forem atendidas as
normas ambientais, a titular do Meio Ambiente, Ana Lya Uriarte, introduziu um
sinal de dúvida. Isto porque no último sábado informou que o projeto-piloto da
Estratégia Nacional de Gestão de Bacias Hidrográficas acontecerá nos rios
Copiapó, da região de ATacama; Rapel, na região de O'Higgins, e Baker, em
Aysén.
Os ambientalistas esperam os resultados de um estudo sobre a
matriz energética que é preparado por técnicos de instituições do governo, como
o Ministério de Energia e o Programa País Eficiência Energética, junto com
acadêmicos das universidades do Chile e Federico Santa Maria. Porém, estão
estudando todas as alternativas legais existentes para evitar a materialização
do projeto, afirmaram. Kennedy pretende também se reunir com parlamentares e com
o pré-candidato presidencial do Partido Nacional, de oposição e direitista,
Sebastián Piñera. (IPS/Envolverde)
(Envolverde/IPS)