O poderoso lobby multinacional do Ecad

Por trás do palavrório patriótico, a ministra Ana de Hollanda traz uma mensagem portadora de razões objetivas para prosseguir não só defendendo aferradamente o Ecad, como assentando o fruto do neoliberalismo cultural nas novas realidades e disciplinas do espaço cultural brasileiro.
Não é preciso tantas reflexões para perceber que Ana de Hollanda particularmente estimula um laboratório de geografia política que busca um mercado neoliberal de cultura. Logo no primeiro capítulo, Ana busca uma interpretação caótica para defender os criadores brasileiros, mesmo sabendo que a maioria das criações não é considerada pelo Ecad sequer como subproduto de suas políticas de distribuição.
Portanto, independente da autorização de cada autor, as multinacionais que controlam o Ecad o fazem nos espaços públicos e, agora, com Ana de Hollanda no comando do MinC, as práticas do Ecad ganham status de política de Estado.
Uma das características do neoliberalismo é criar uma esquizofrenia nos espaços geográficos e, assim, as multinacionais que comandam o Ecad atacam as atividades criativas e o pensamento livre para lucrar cada vez mais produzindo cada vez menos.
Ana de Hollanda e seus afins tentaram criar uma torre de babel sobre a questão dos direitos autorais e da soberania da nossa cultura para causar vertigens conceituais na sociedade dando a ela uma explicação confusa para ser confusamente percebida.
Ana só não imaginava colher um fruto tão amargo com críticas extraordinárias ao seu abuso de poder. Se Ana de Hollanda criou uma fábula dizendo defender o criador, o compositor brasileiro e a soberania do país, a cada dia suas filosofias são desmascaradas em quantidade e qualidade com artigos preciosos que permitem um entendimento limpo e transparente sobre o que está por trás desse jogo de poder.
Até então não se ouviu da ministra nada que se configure em projeto nacional. Sua contrapartida às políticas de Gil e Juca está focada, sobretudo na dissolução das ideologias que fortaleciam os movimentos populares protagonizados pela população, os quais o MinC, no governo Lula, irrigou com suas políticas como a principal semente da cultura brasileira. Ana parece querer sustentar a tirania da informação e do dinheiro. Por isso fala em benefício exclusivo dos poucos artistas que ganham com a massa de recursos extraída dos espaços públicos da sociedade brasileira que vai para as multinacionais.
A equação é simples, a indústria fonográfica multinacional quebrou. Sua forma de sustento hoje no Brasil se dá através do controle do Ecad que vem batendo recordes de arrecadação ano após ano, mostrando a perversidade desse mecanismo, ou seja, as multinacionais quanto menos produzem mais arrecadam. E o que é o neoliberalismo global senão esta forma de busca pela exploração dos povos pelos sistemas de super lucro.
A linguagem anti-imperialista surpreende, vindo de onde vem. Os defensores da tese são os sócios locais da indústria cultural internacional, sobretudo do setor fonográfico – empresas nada nacionais como a Warner, a Sony, a EMI e a Universal. Obviamente, a acusação é apenas um jogo retórico, mas como tem encontrado algum eco, não seria despropositado relembrar alguns fatos básicos.
No mercado de música brasileiro, os autores são brasileiros, mas as empresas são estrangeiras. O discurso pseudo-nacionalista só pode funcionar porque o Brasil tem uma situação ímpar: é o único país, fora os Estados Unidos, onde o consumo de música nacional é superior ao de música estrangeira. No entanto, essa música nacional é explorada por empresas majoritariamente estrangeiras: a Warner, a Sony, a EMI e a Universal. O que temos, portanto, é uma associação entre os grandes autores nacionais (os velhos nomes da MPB e os novos nomes do pop e do sertanejo) e as grandes empresas internacionais.
O Brasil é altamente deficitário em direito autoral. Se há ainda alguma dúvida que a exploração do direito autoral é interesse estrangeiro, basta olhar a balança comercial de direito autoral do país com os Estados Unidos. Todos os anos enviamos mais de 2 bilhões de dólares como pagamento de direito autoral (em todos os setores – não apenas música). Os americanos, por sua vez, nos pagam apenas 25 milhões”. (Pablo Ortellado).
Ao contrário da ideia de integridade nacional, esse caldo de cultura do novo MinC com o Ecad nos leva à quebra da cultura nacional. Quando a ministra da cultura defende o Ecad e subordina o MinC a seus interesses, ela tenta desfazer a queda de braço do Estado com as multinacionais que controlam esse órgão privado, condenado em CPI, que vem se  especializando em extorquir o cidadão brasileiro em suas atividades comuns nos espaços públicos. É ai neste sistema perverso de exploração que o Ecad vem obtendo cada vez mais arrecadações milionárias.
A tendência que o MinC quer seguir, sob o atual comando, é ser arrastado à subordinação do processo da globalização cultural. É esta a pedagogia do novo MinC e sua secretaria da economia criativa, estimular sem limites uma das faces mais perversas da globalização financeira.
A hegemonia do Ecad é a própria hegemonia das multinacionais que cria um emaranhado de técnicas a partir do qual esse órgão passa a ter poder fiscalizador sobre cada compositor e cada cidadão brasileiro sem que ele próprio, o ECAD seja fiscalizado.
Ana de Hollanda insiste que, em nome de acordos internacionais, o Ecad, controlado por multinacionais, não pode se subordinar às leis brasileiras. E, com isso, uma ministra de Estado estimula, aí sim, a prática institucional da pirataria cultural, transformando em terra de Malboro o ambiente cultural brasileiro, aonde um sistema transnacional comandado no Brasil pelo Ecad põe toda uma sociedade de joelhos.


Carlos Henrique Machado Freitas http://www.myspace.com/carloshenriquemachado
Bandolinista, compositor e pesquisador. Para mais artigos deste autor clique aqui

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