“Canetinha chata!”

- Ei! Psiu!
- Ahn? Onde?
- Aqui!
- Aqui, onde?
- Na sua mão!
- Na minha mão?
- É!
- Ué, uma caneta que fala!

- Tá ficando louco! Caneta não fala!
- Mas e o que você está fazendo?
- Eu? Eu estou falando com a sua consciência.
- Minha consciência?
- É! Pôxa! Você vive criando diálogos dos seus personagens com a sua consciência, e não está entendendo o que está acontecendo?
- Não!
- Veja bem! Você está pensando que eu estou falando com você, e você está pensando que está falando comigo, entendeu? Ou não entendeu?
- Mas...
- Não! Não precisa abrir a boca para falar comigo. Basta apenas pensar que está falando comigo!
- Ahhhhhhh!
- Ufa! Até que enfim, você entendeu! Já estava ficando preocupada!
- Tá! Tá bem! Mas preocupada, por quê?
- Porque você... Ah, deixa pra lá. Vamos mudar de assunto. Mas, quem é o figurante aí do seu lado?
- Esse aqui do meu lado?
- É!
- Bem, ele é um escritor famoso.
- Hum! Nunca vi mais gordo!
- Mas que canetinha abusada!
- Abusada, não! Menosprezada!
- Menosprezada, porque?
- Porque além de você, a bichinha aí do lado, tá tirando a maior onda comigo! Tá me esnobando!
- Mas que bichinha?
- A gorducha!
- Que gorducha?
- A que tá na mão dele!
- Mas é só uma caneta!
- E você pensa que ela não tá falando! Olha lá! Tá rindo de mim!
- Rindo porque?
- Porque você me trouxe aqui nesta festa, com esse vestido transparente, e tá todo mundo vendo o meu corpinho azul.
- Era só o que me faltava!
- Faltava o quê? Você bem que podia ter me dado um vestido novo!
- Ham! Uma caneta abusada, que pensa que fala, e agora acha que quer um vestido? - Brincadeira!
- Brincadeira? Sacanagem é o que você faz com as minhas irmãs!
- Estão todas morrendo de raiva de você!
- Porque?
- Porque você usa e abusa de algumas, e deixa as outras mofando, esperando por você. Pô! Vê se te manca, cara!
- Essa é boa!
- Hahahahahahahahahahaha!
- O que houve?
- Olha lá! A bichinha levou outro tombo. Hahahahahahahaha!
- Pára de rir!
- Hahahahahahahahahahaha!
- Pára de rir! Eu já falei!
- Hahahahahahahahahahaha!
- Pára de rir! Você está me tirando do sério!
- Tirando do sério porque? Veja, com toda aquela pompa, levou outro tombo!
- Já falei, pára de rir! Se não eu vou rir também!
- Porque? Você não pode rir, não?
- Não! O que os outros vão pensar?
- Sei lá! Vão pensar que você está achando isso ótimo.
- Ótimo de quê?
- Chega! Vamos mudar de assunto!
- Ufa! Ainda bem! Já não agüentava mais ouvir as suas gargalhadas.
- Ah, mas que foi engraçado, foi! Você não viu?
- Vi o quê?
- O gordo tentando segurar a bichinha pelos quadris, mas os dedos acabavam escorregando, iam para as pernas e ela levava o tombo.
- Muito bonito! Né! E como é que você sabe que ele estava segurando ela pelos quadris?
- Ué! Você também está fazendo a mesma coisa!
- Hmmm!
- Ó pode parar! Não gostei dessa cara!
- Que cara?
- Essa que você fez!
- Mas eu não fiz nada!
- Fez sim, eu vi!
- Como é que você pode ver, você não tem olhos?
- Tenho sim! Está debaixo deste chapéu horrível que você me colocou.
- Eu não! Você veio assim da fábrica!
- Mas foi você que me comprou!
- Que petulância!
- Petulância, uma ova!
- Pára! Chega! Não agüento mais!
- Eu não!
- Que caneta chata!
- Chata, nada!
- Chata, sim!
- Chata, porque? Só porque te chamei? Não pedi para você me comprar!
- Ah, meu Deus!
- Além do mais, não sei porque você me trouxe aqui neste lugar!
- Mais essa agora! Eu tenho um trabalhão para lançar o meu livro aqui nessa festa, escolho você para dar os autógrafos e você ainda me faz uma dessas! Ora, bolas!
- Mais essa o quê! As minhas irmãs estão chateadas contigo. A pretinha diz que já não agüenta mais trabalhar pra você!
- O que? Não acredito!
- É! Ela me disse, que você usa e abusa dela, e ela coitada, trabalha feito uma condenada!
- Ahn? E daí? E as outras?
- As outras?
- É!
- Bem, a verdinha coitada! Já envelheceu, secou, e você até agora, nada!
- Como, nada?
- Ó, não gostei disso!
- Disso, o quê?
- Desse olhar!
- Mas que olhar?
- Desse que você fez! Você pensa que eu não vi!
- Vai começar de novo?
- De novo nada! Você pensa que eu não escutei?
- Escutar o quê? Eu não falei nada!
- Mas pensou! E eu não gostei!
- Mas eu não pensei nada!
- Mas, imaginou!
- Vamos mudar de assunto. Você já falou da pretinha, da verdinha, e a vermelhinha?
- Ahá! Curioso, você, né? Agora tá interessado no que a vermelhinha me disse, né?
- Conta logo e fim de papo!
- Fim de papo, nada! Ela me disse que te acha um saco!
- Saco? Mas...
- É! Você só lembra dela de vez em quando.
- E você? Sua tagarela!
- Eu? Que tem eu?
- O que você acha de mim!
- Hum! Não sei!
- Sua fingida! Eu que sempre te tratei bem, te trago para esta festa, e fica fazendo fofoca das suas irmãs! Sabe o que é que eu vou fazer, quando você me sacanear?
- Vai fazer o quê?
- Vou te jogar no lixo!
- Hum! Duvido!
- Duvida? Você vai ver!
- Vou ver nada! Quem vai ver é você! Você não me conhece... Não sabe como eu sou ... principalmente quando estou de cabeça quente.
- Eu sei! Mas não sou trouxa! E coloco você de cabeça pra baixo, pra você não sujar o bolso da minha camisa, como você sempre faz com os outros, tá!
- Pôxa... Só queria me divertir um pouquinho...
- Mas já encheu a minha paciência! Pra mim chega! Vou colocar o chapéu nos seus pés, e te pôr de cabeça pra baixo, no meu bolso. E quando você chegar em casa, vou te colocar no lixo, como já fiz com tantas outras.
- Ahá! Assassino de canetas!
- Chata! E chega de papo! Hum!
- Ai não me apertaaaaa!
- Pronto! Agora essa caneta não me perturba mais!
...
- Moço, me dá um autógrafo? Gostei dessa crônica!
- Ah, não! De novo, não!
...
Iuhú! Voltei!
Ah, não! Vai começar tudo de novo!


 

* O autor é Bacharel em Comunicação Social pela Faculdade de Filosofia de Campos, com especialização em Jornalismo.

 

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