Entra e sai ano e as tragédias causadas pelas fortes chuvas no Rio, essencialmente na Região Serrana, são recorrentes. Isso significa que não somos mais pegos de surpresa, muito menos as autoridades que deveriam ter planejamento para prevenir os estragos e as inúmeras mortes. O descaso é o principal fator para que esse roteiro dramático, protagonizado por centenas de famílias que perdem casa, vidas e dignidade, se repita de forma cruel e avassaladora.
Somente em 2011 foram mais de 500 mortos em Friburgo, Petrópolis, Teresópolis e Sumidouro, episódio que ficou conhecido como a maior tragédia climática da história do país. Um ano antes, já tinham sido mais de 280 mortes em Angra dos Reis e Ilha Grande, no Morro do Bumba, em Niterói, na Cidade do Rio e em outras atingidas por temporais.
Especialistas explicam que as sucessivas tragédias acontecem devido à falta de planejamento urbano que não seja voltado a interesses pessoais e pecuniários de grupos dominantes. Na região serrana, por exemplo, na parte alta das montanhas o terreno é inclinado e a vegetação cresce sobre uma camada fina de terra. Conforme a água da chuva penetra no solo, encharca-o e o descola da pedra. Assim, a terra desce como uma avalanche, devastando o que encontra pela frente.
Não fosse trágica seria cômica a utilização econômico-política da identificação das áreas de risco. No Morro do Bumba, o Poder Público incentivou a moradia, a despeito de ser antigo lixão. No entanto, se trata de solo impróprio para habitação, mas nada se alertou para a população.
Em outros casos, porém, áreas passíveis de soluções ambientais e planejamento urbano, com viabilidade para a permanência dos moradores, têm a recusa do Poder Público que, normalmente aliado aos interesses privados, opta por remover as famílias sob a justificativa de risco.
Paralelo a esse cenário está a lentidão do Poder Judiciário que, na maioria dos casos, demora anos sem que a justiça seja feita. Muitas famílias do episódio de 2011 ainda não foram indenizadas pelas suas perdas e seguem desamparadas não só pelo insuficiente aluguel social, mas também pela morosidade da Justiça.
Está claro que as consequências das chuvas não se devem só aos fenômenos naturais, mas também à banalização da vida pelo próprio Poder Constituído que, em vez de proteger o cidadão, o deixa vulnerável e desassistido.
* Advogado