Lorotas para Copenhague

A maior fatia da matriz de energia elétrica brasileira é representada pela geração hídrica com cerca de 77,5% do total da oferta. Afora alguns projetos desastrosos do ponto de vista ambiental, como os planejados para a área amazônica, a geração hídrica é renovável e ambientalmente neutra quando bem projetada e manejada.

As usinas de Santo Antônio e Jirau, a serem construídas na calha do rio Madeira, em Rondônia, contradizem toda e qualquer política governamental de preservação da Amazônia e de redução de taxa de desmatamento de nossas florestas tropicais por estarem sendo projetadas para alagar grandes áreas planas no coração da Amazônia, tendo como resultado a destruição da mata. Qualquer idiota sabe que represar água numa região de plana - como a nossa Amazônia - implica em produzir um reservatório de grandes dimensões e baixa profundidade e, portanto, de baixa eficiência sob o ponto de vista de engenharia. Apenas a usina de Jirau irá inundar uma área equivalente a três vezes à ocupada pela calha do rio no trecho considerado.

Assim, num momento em que deveríamos estar comemorando o crescimento da área reflorestada, o próprio governo lidera na redução da cobertura vegetal da floresta tropical mais importante do planeta. Aliás, na mesma linha de raciocínio, temos sido testemunhas, com elevada freqüência, do fato de a imprensa informar que o governo federal vem assiduamente festejando a queda da taxa de desmatamento na Amazônia. Honestamente, este não é um motivo para se comemorar. Comemoração mereceria a inversão da tendência, a saber, o crescimento da taxa de reflorestamento, não só na Amazônia, mas também em nossa moribunda Mata Atlântica e em outros biomas representativos e também depredados.

Outro dado preocupante tem sido a euforia com que se divulga a descoberta e a futura produção de petróleo e gás natural que vem sendo descobertos na camada pré-sal. Dentre os planos do governo está o de duplicar a atual produção de óleo brasileira, alcançando 4 milhões de barris de óleo equivalentes até 2020. Cerca de 50% deste acréscimo visam atender a crescente demanda do mercado interno, enquanto que a outra metade se destina à exportação. Assim, não só esta produção vai tornar nossa matriz energética mais suja, como também contribuiremos para sujar a matriz de outros países.

Entretanto, não podemos parar por aqui. Recentemente o governo concedeu incentivos fiscais para a compra de veículos de passeio, em boa parte dos casos para uso individual, agregando milhões de veículos à frota de nossas já saturadas e congestionadas metrópoles. Poderão alegar alguns que parcela significativa desses veículos é do tipo “flex” que podem queimar etanol em seus motores. É claro que o uso de etanol, produzido da cana-de-açúcar, é muito mais saudável que o uso de gasolina ou diesel. Entretanto, mesmo a cana-de-açúcar não é inteiramente “verde”, pois todos sabemos que as plantas retiram gás carbônico do ar para realizar a fotossíntese, mas devolvem uma parcela desse gás à atmosfera durante sua respiração. É claro que há plantas cujo saldo de remoção de CO2 é melhor que o da cana-de-açúcar. Daí a necessidade de reflorestamento utilizando as espécies vegetais originais e não a ocupação de grandes áreas com as monoculturas, inclusive da cana-de-açúcar.

Um dado alarmante é que para absorver os 400 milhões de toneladas de CO2 a serem emitidos apenas em 2009 no Brasil, será necessário o reflorestamento de 6.974 km2, equivalentes a 900.000 campos de futebol de 110 por 70 metros.

Em função dos dados aqui apresentados, fica evidente que a proposta brasileira de reduzir em 39% as emissões de gases de efeito-estufa – CO2 e NO2 basicamente – resultantes da combustão de derivados de petróleo e de carvão mineral não passa de mais uma lorota dentre as muitas que serão contados na Cúpula de Copenhague a se realizar neste mês.
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