A última notícia de Wado Tigrão, ou seja, Mohamed Hamad

Tempos atrás encontrei o Wado Tigrão, amigo de quem não tinha notícias há muito  tempo. Estava com uma cara estranha, um terno preto, barba enorme, uma longa  gravata preta em cima de uma camisa de seda branca, olhos esbugalhados. Tinha o  aspecto de fim do mundo. Um perfeito sósia do falecido Enéas. Fiquei arrepiado.
 
Cautelosamente cheguei perto do amigo e perguntei:

“Que cara é essa ?”

“Agroa sou muçulmano, me converti ao Islamismo, e sou um fundamentalista!”

Fiquei espantado com a rapidez da revelação.

E o meu amigo Wado Tigrão continuou a sua explicação:

“Lá em casa eu sou um aiatolá caseiro. O absoluto, onde o “outro” não existe, pois de  verdade em verdade vos digo que o outro “sou eu”. O único ponto de vista que pode ser  aceito é o meu. Minha mulher não usa decote, não coloca maquiagem, minisaia nem  pensar, não sai à rua, e quando o faz eu exijo que ela cubra o rosto e use vestidos  longos e pretos. Minhas duas filhas estão sendo educadas por uma professora  particular, para não se exporem aos olhos sedentos de sexo do mundo. Na minha casa  ninguém bebe, nem fuma. Só recebo visitas de quem compartilha o mesmo modo de  vida. Nada de televisão, nem cinema, nem teatro. Internet, nem pensar. Alá é meu  Deus.”

Sem saber bem o que dizer, fiz a pergunta clássica:

“Você é feliz dentro do seu fundamentalismo, Tigrão ?”

“Muito feliz! Nunca fui tão feliz na minha vida. E para sua orientação o meu nome atual é  Mohamed Hamad.”

Dito isto, me deu um abraço, se despediu, entrou num táxi, e disse:

"Que Alá o proteja !"
 
Vale a pena lembrar que o Fundamentalismo é a doutrina que usa as palavras sagradas  na plenitude de seus fundamentos, sem nenhuma concessão as novidades da época,  que enxerga os dias de hoje com a visão dos antigos preceitos religiosos.

Eles não aceitam o criticismo, o movimento teológico moderno que interpreta as  palavras sagradas de acordo com a época em que é lida, porque estes criticistas acham  que as circunstâcias em que os textos foram escritos eram completamente diferentes da  atualidade.

O fundamentalista segue fielmente os textos sagrados das Escrituras em que se  baseiam as suas religões, sejam elas Bíblia, Talmude, Corão ou o Hadith.

No início do século passado, quando a sociedade americana passou por um profundo  processo de liberalização, modernização, democratização, e passou a aceitar a  concepção darwiniana da natureza que é o oposto do criacionismo, isto é, que exige a  interpretação literal do Gênesis bíblico, e afirma ser a natureza um ato de criação divina  e portanto intocável pelo homem, houve um afrouxamento dos costumes religiosos, e  uma onda de prazer invadiu a civilização americana, tornando a vida de todos mais  confortável e livre. As mulheres começaram a sua luta pela emancipação, os jovens  deixavam suas casas para terem uma vida independente, e a diversão passou a ser a  prioridade para todos.

Contra este estado de coisas os fundamentalistas fundaram a WCFA (World´s Christian  Fundamental Association) em 1919. Os fundamentalistas passaram a ser contra  qualquer renovação dos costumes e hábitos.

Mas eles ganharam força mesmo foi com o advento da guerra fria em 1947, com o início  da militância anti-comunista. Surgiram vários pastores fundamentalistas nos meios de  comunicação, direcionando os americanos na luta contra o “Império do Mal”, conforme  gosta tanto de falar o atual presidente George Bush, quando se refere ao Iraque.
Naquela época, apoiados por americanos endinheirados, os pastores fundamentalistas  exerceram uma grande influência nas eleições americanas.

Com o término da guerra fria, os fundamentalistas americanos direcionaram suas  baterias contra o aborto, contra a Emenda da Emancipação da mulher, contra os direitos  dos homosexuais, e passaram a exigir a introdução da reza obrigatória nas escolas  públicas.

Eles querem a preservação do mundo caipira, pois acham que o mesmo ainda não foi  corrompido pela modernização urbana.

O presidente Ronald Reagan (1981-1989) deu todo o apoio a cognominada “Maioria  Moral”, pois a mesma era muito útil na mobilização anticomunista.

Atualmente o presidente George Bush é o fundamentalista americano de plantão, que  iniciou uma verdadeira guerra santa contra o fundamentalismo islâmico, que nunca  deixou de existir, mas que só começou a ser notado a partir da revolução Xiita no Irã,  em 1979.

Foi o movimento dos aiatolás que conseguiu mobilizar todas as energias islâmicas que  estavam adormecidas pela presença da modernidade. Tal qual os fundamentalistas  americanos, os islâmicos consideram como sua política básica o retorno às leis corânicas,  ao espírito da leis das Sagradas Escrituras do profeta Maomé.

Para eles, os costumes ocidentais resultam da perversão.

A modernidade é o império de Satã, que utiliza instrumentos sedutores como a música, a  bebida, as boas roupas, os automóveis caros, e tantas outras “tentações”, como uma  maneira de contaminar a pureza dos verdadeiros muçulmanos.

De todas as formas de fundamentalismo hoje vigentes no mundo globalizado pelos  norte-americanos, o fundamentalismo de mercado é o mais mesquinho.

O fundamentalismo de mercado impõe seus valores a todos os povos. Economicamente  ou financeiramente, se possível, mas à bala se necessário.

O fundamentalismo de mercado é a total devoção ao comércio e sem nenhuma  preocupação com o social.

Os americanos globalizaram o mundo, mas não reconhecem nada que seja contra a  entrada de dinheiro no seu caixa.

Quem pensa diferente deles nunca tem razão.

Outro dia encontrei a seguinte notícia  no jornal:
 
“A Polícia Federal, por ordem do FBI dos Estados Unidos, prendeu um muçulmano  suspeito de pertencer a rede terrorista Al Quaeda. O acusado, Mohamed Hamad alega  inocência, e diz que vive exclusivamente para a família. Ele deverá ser entregue a justiça  americana, que diz ter provas irrefutáveis contra o terrorista.”

Fiquei frio, comecei a tremer.

Lá estava a foto do Wado Tigrão, com sua barba negra, sua aparência sinistra, e sua  aparência de Mohamed Hamad.

Estava terrívelmente orgulhoso na foto.

"Que Alá o proteja !" 

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