Na África do Sul, a volta às aulas em um cenário de tensões raciais

Um liceu (colégio, escola de educação secundária), situado a 50 km ao sul de Joahnesburgo, tornou-se, há 3 dias, o centro das atenções: uma rixa local.

policiais na africa

À frente do​ colégio sul-africano Hoërskool Overvaal, duas ​fitas amarelas da polícia delimitam uma área de acesso proibido e bloqueiam a rua. De um lado das fitas estão os pais de alunos brancos, apoiados por grande número de membros de suas comunidades, fazem um piquete. Do outro lado, os pais de jovens negros protestam contra a recusa do estabelecimento em receber seus filhos. Neste colégio, situado a 50 km de Johanesburgo, depois de três dias como centro das atenções na África do Sul, uma rixa local transformou-se em debate nacional e reabriu as feridas do Apartheid.

Apesar do verão no hemisfério ​sul prosseguir a plena carga, os alunos sul-africanos retornaram às aulas na quarta-feira, 17 de janeiro. Todavia, em Vereeniging​, um vilarejo de aparência calma cercado por campos, a rua que passa à frente do principal colégio público se tornou um verdadeiro campo de batalha: acusações racistas, manifestantes apressados e feridos, militantes detidos, caminhão policial incendiado...

​No centro do problema estão 55 alunos anglófonos, negros em sua maioria, residentes​ nas áreas vizinhas, cujos pais querem matriculá-los no estabelecimento de ensino secundário mais próximo de suas casas. Ora, no Hoërskool Overvaal​ o ensino é feito​ exclusivamente em africâner. Língua dos primeiros colonizadores, oriunda do holandês e do crioulo, ela claramente simboliza a opressão da minoria africâner sobre o restante do país no tempo do Apartheid.

"É uma escola pública, paga por nossos impostos"

Em 1976, a célebre revolta de Soweto, fazendo uma reviravolta na luta contra o regime segregacionista, já foi uma resposta à decisão do governo de impor o africâner na escolas, ao passo que a maioria negra preferia o inglês. Com o fim do Apartheid e agora que a euforia dos anos Mandela foi reduzida, essa contestação volta a ser o tema do dia. Em 2015, um movimento estudantil chocou-se violentamente contra o tratamento sempre favorável àqueles que estudavam em africâner. No processo, algumas universidades optaram por adotar o inglês como idioma de ensino.

​"Não queremos dizer que é preciso eliminar o africâner. Porém, esta escola deve também receber os jovens anglófonos e oferecer-lhes o ensino em inglês​. É uma escola pública, mantida por nossos impostos, antes de tudo construída para os moradores desta área", afirma Micah Mtalala, um dos pais dos 55 alunos rejeitados. O departamento provincial de educação está do lado dele. Ao fim de 2017, este último pediu que o Hoërskool Overvaal​ recebesse os jovens envolvidos.​ "O departamento está disposto a enviar professores anglófonos", informa ele.

​Todavia, dois dias antes do reinício das aulas, arguindo falta de vagas, o estabelecimento foi à justiça para tentar anular a decisão. Furiosos, os pais negros​ decidiram fincar pé. Rapidamente, os militantes do CNA (Congresso Nacional Africano), o partido no poder, e do EFF, o partido da esquerda revolucionária, se juntaram a eles, e o tema tornou-se um problema político em escala nacional. Um desentendimento com um pai de aluno branco foi amplamente divulgado pela mídia. E enquanto a situação se deteriora, a polícia dispersa manifestantes com balas de borracha, granadas neutralizantes​ e faz alguns feridos.​

 

"Nossa nação branca pode lutar por nosso idioma"

Nas redes sociais a situação fica fora de controle.​ Uma militante branca do CNA que apoia ​os ​pais d​os​ estudantes rejeitados​, tornou-se objeto de insultos​ e candidata a ser sexualmente violentada por extremistas brancos, À vista disso, os radicais do EFF cantam "atiremos para matar o Boer", o agricultor africâner. Na quinta-feira, a violência atingiu um novo nível quando um manifestante negro atirou um coquetel Molotov sobre um caminhão da polícia, que se incendiou. No total, em dois dias, quase 40 pessoas foram presas.

​No terceiro dia, a última sexta-feira​, várias dezenas de africâners chegaram para demonstrar seu apoio à escola, com bolas e bastões de cricket. "Nós queremos dar exemplo e mostrar à África do Sul que nossa nação branca é solidária e pode lutar por nosso idioma", pode-se ler em uma mensagem circulando no WhatsApp, escrita em africâner, incentivando a comunidade a se mobilizar.

​Nas ruas, eles têm ordens de não falar à mídia, ficarem calmos e evitarem ​excessos. Pierre Ronquest, que trabalha no colégio como orientador psicológico, chegou para saudá-los. Ele se propõe a dirigir uma oração coletiva e lê, em voz alta, uma passagem da Bíblia em seu smartphone. "Nós somos pacíficos", destaca ele. "Sim, e é por isso que somos brancos", grita um homem da plateia e tanto pior para as derrapagens.

 

"É a África do Sul, eles estão acostumados"​

"Só desejamos que este colégio continue em africâner", explica Vanig F., pai de aluno e membro do conselho de administração, que tenta eliminar as discordâncias. "Todas as escolas na África do Sul se tornaram bilíngues ou passaram a ensinar em inglês. Só restam duas e elas estão completamente cheias".

Um simples comentário ou a pior provocação de sua parte, Hardus Visagie, também membro do conselho de administração, se mostra mais duro. "É a única escola do sul da província onde 100% dos alunos têm seu bacharelado", acrescentou ele antes de ser tratado como "racista" por uma horda de manifestantes do CNA.

"Essas pessoas são os opressores brancos. Eles pensam que um jovem negro não é digno de frequentar esse colégio", desabafa Bafana Mtimkulu, cujo filho foi rejeitado. "Ou decidem deixar uma sociedade onde os cidadãos são iguais ou deixam esta escola que foi construída para todos."

Do outro lado da grade, os principais envolvidos , os alunos, continuam seus cursos como se nada estivesse ocorrendo. Não saberemos sua opinião. Seus pais garantem que eles não são afetados pelas batalhas que acontecem à frente de suas salas de aula. "É a África do Sul, eles estão acostumados", comenta um pai antes de ser advertido por um de seus companheiros.

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