LUAR DE IMBETIBA

Psicanálise de uma cidade / Por José Milbs

A FALA DE AROLDO MEIRELES O SERESTEIRO

Macaé rompeu o milênio e com ela o Velho seresteiro de 75 anos e um pulmão de fazer inveja. Aroldo Meireles chegou em Macaé nos anos 40, com o ele mesmo me disse, no dia 2 de setembro de l943 quando a cidade, ainda com nuvens de um sol meio tímido, recebia os acordes das madrugadas com as retretas da "Lyra dos Conspiradores" e da "Sociedade Musical Nova Aurora."

Eles vieram para a cidade e sua irmã casou se com uma família tradicional da Rua do Meio. Casou se com Décio Viana, filho de dona Maria e de seu Bráulio que moravam perto da cocheira da Prefeitura onde a gente jogava futebol. Esta cocheira ficava a uns 30 metros da Praia de Imbetiba ainda sem muralhas, sem pedras sufocantes e navios jogando cocos e mijos internacionais.

Conta que, depois, se casou com sua atual e sempre companheira que era filha do ferroviário" papa-capim" que, também, era pai de "Waldyr Mergulhão" que toda a cidade conheceu nos bons tempos de mergulhos no "Rodrigo" e nas "Pedras do Hotel de Imbetiba"

Com Célia Viana Meireles ele teve l0 filhos dos quais apenas 5 sobreviveram a uma vida de luta e de dificuldades cujo sustento vinha como Lustrador da Marcenaria do "Manduquinha", "pater-mater" de toda musicalidade desta cidade de sol aberto e luar tímido.

Aroldo, é filho de pais também ligados a música. Seu pai violeiro e sua mãe cantora de Igreja em Cabo Frio.

As noites macaenses já se acostumaram com este homem de corpo extremamente franzino, cabelos brancos, corpo arquejado, de pele enrugada e deliciosamente pura e quente que canta músicas de Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Dorival Cayme, Carlos Galhardo, Chico Alves e Ary Barroso.

Senhor de um domínio fora do comum de palco, sua voz já harmoniza- se com a divindade em tardes noites durante anos a fio. Aroldo não canta ele se faz veiculo da voz. Não tinha e não tem lugar certo para encantar as pessoas. Canta em bares, casas noturnas, boites e cantarola nas praças quando busca tomar conduçao para sua casinha simples no Bairro de Aroeira.

Da rua do Meio recorda de "Meca"o ferroviário que gerenciava a saída do "Bloco do Independente" e sorri de amor em canto de lábio maneiro quando se refere a "Titinha" nossa "Mãe do Samba dos anos 40". Ele me concedeu este entrevista quando fazia Niver e me viu sentado numas das bocadas da noite macaense. E continuava a falar o seresteiro:

OS MEIRELLIS

Orgulha-se de ter l5 irmãos, todos Meireles vindos de Niterói, uma família que ele diz não ter nada com os Meireles de Ricardo e de Carlinhos. Eles são meus amigos, me aplaudem quando canto mais sua genética é outra, fala orgulhoso de seus ascestrais.

Sua fala ainda mantém o brilho das madrugadas e de um corpo que dificilmente será tombado ainda. Uma mente privilegiada ele tem suas histórias ligadas as essências macaenses e mantém a velha dignidade dos grandes da noite.

Aroldo ainda é dos poucos que chama de "Pinguin", um apelido que soa ainda com gosto de meninice e afeto.

De sua voz sai sonora e faz com que a classificaçao dele de "O velho Pinguin da Rua do Meio" me jogo no lindo labirinto alegre e feliz nas lembrança de meus tempos de menino na Rua Doutor Bueno.

Aroldo faz parte de um tempo onde reinava o bom gosto das vozes de Osmar Rocha, pai de "Osmarzinho do Cartório das Pequenas Causas".

Osmar ornamentava as noites de Domingo no Ipiranga onde Armando Marconi, que morava no Hotel Tupã na Praça Veríssimo de Mello, fazia com que o piano tivesse entrada sem porta nas articuladas junções dos auditivos desta época de amor brilhante.

Às vezes Osmar chegava meio atrasado para finalizar as tardes noites e o velho Armando se impacientava e repetia musicas que eram sempre acompanhadas por Charutinho, Dulcilano e Shirley Sampaio.

"Cansado de Tanto amar. 
Eu quis um dia criar. 
Na minha imaginação... 
Dei lhe a voz de Dulcinéia. 
A malícia de Frinéia 
E a pureza de Maria... 
Em Gioconda fui buscar. 
O sorriso e o olhar. 
Em Dubareix o glamord... 
E assim, de retalho em retalho, terminei o meu trabalho, 
no meu sonho de escultor. 
E quando cheguei ao fim...tinha diante de mim... 
Você, só você, MEU AMOR"....

Está chegando ao fim esta Acontecencia. Finalizando afirmo: ouvi Osmar Rocha cantar Nelson Gonçalves e e vi Nelson, sentado na minha mesa, na "Fazenda Meu Descanso" do ex- deputado Carlos de Freitas Quintella aplaudir e abraçar Osmar Rocha e Aroldo Meirellis pelas lindas vozes na noite das serestas macaenses..

Nelson Gonçalves e seu filho Nelsinho estavam em minha mesa e pude olhar nos olhos do velho seresteiro a felicidade em ter sido clonado tão bem.

Era lá, na fazenda Deputado e Seresteiro Carlos de Freitas Quintella, que se completava as noites macaenses nos anos 60.


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