Hugo Chávez deixa marca profunda

Hugo Hugo Chávez deixa marca profunda
Hugo Chávez cumprimenta uma menina durante campanha eleitoral. Foto: Comando Carabobo da campanha eleitoral 2012

Caracas, Venezuela, 6/3/2013 – O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que morreu ontem no Hospital Militar de Caracas, vítima de câncer no abdômen detectado em junho de 2011, marcou de forma indelével a história política de seu país. Nascido em 28 de julho de 1954 em Sabaneta, um pequeno povoado nas planícies do sudoeste da Venezuela, foi o segundo dos seis filhos varões de Hugo de los Reyes Chávez e Elena Frías, dois humildes professores rurais.

Criado principalmente por sua avó, o jovem Hugo se apaixonou por jogar basebol e aos 17 anos, encerrado o curso secundário, entrou para a Academia Militar. Fez carreira no exército ao mesmo tempo em que, com a patente de tenente, começou a organizar células conspiradoras, reunidas depois no que chamou de Movimento Bolivariano Revolucionário-200, influenciado por seu irmão mais velho, Adán, militante do Partido da Revolução Venezuelana, orientado pelo líder guerrilheiro Douglas Bravo.
Chávez entrou na história da Venezuela na manhã de 4 de fevereiro de 1992, no momento de se render após liderar uma falida e cruenta sublevação de vários batalhões do exército contra o então presidente Carlos Andrés Pérez (1974-1979 e 1989-1993). Com uniforme de combate, boina vermelha de paraquedista e andar aprumado em meio aos nervosos oficiais que o conduziam detido, improvisou um discurso de 70 segundos dirigido aos companheiros ainda rebelados, mas que calou imediatamente em milhões de compatriotas que acompanhavam o acontecimento ao vivo pela televisão.
“No momento, nossos objetivos não foram atingidos, mas o país tem que caminhar para um destino melhor, e eu assumo perante vocês e perante toda a Venezuela a responsabilidade por este movimento militar bolivariano”, afirmou, ao pedir o fim da luta para evitar mais derramamento de sangue. Em lugar de sangue, correram a tinta e as vozes de múltiplas análises sobre como, em um país com milhões de excluídos e falta de líderes que assumissem as falhas do sistema político, um jovem oficial assumira sua responsabilidade em nome de um movimento que invocava o libertador Simón Bolívar (1783-1830).
Assim nasceu sua lenda e sua popularidade. Esteve preso por dois anos e depois, com indulto do presidente social-cristão Rafael Caldera (1969-1974 e 1994-1999), percorreu o país promovendo esperanças de uma nova insurreição, até que, em 1996, pela mão do veterano esquerdista Luis Miquilena, optou por buscar o poder por meio das urnas. Fundou, então, o Movimento V República (MVR), que avançou enquanto enfraqueciam os partidos tradicionais, no poder desde 1959, e ganhou as eleições presidenciais de 6 de dezembro de 1998, com 56% dos votos.
Desde então e até 2012, em outras 15 eleições essa porcentagem de adesão à causa de Chávez se manteve como média. Os setores mais pobres da população sempre foram seu principal suporte. Às razões econômicas, sociais e culturais que explicam esse apoio, “a esperança de justiça que sempre habita o profundo da alma dos pobres”, juntou-se o carisma de Chávez, apontou à IPS o antigo líder socialista Teodoro Petkoff.
Sinais desse carisma são sua fácil identificação com o venezuelano mestiço e informal, seu verbo agitador e voz de comando, com um discurso às vezes contendo algo de pregador religioso, e repleto de menções a Bolívar e às lutas independentistas e agrárias do século 19. Com grande naturalidade diante do microfone e das câmeras, desde que chegou ao governo se dirigiu ao país cerca de 2.200 vezes por meio de redes de televisão e rádio.
Também somou quase 400 edições do programa dominical Alô, Presidente, no qual explicava por várias horas, e quase sempre em tom coloquial, questões políticas, de gestão, de seu passado militar e de história, às vezes a universal e outras a do país. Chávez promoveu causas de esquerda e governos com semelhanças com o seu na América Latina e no Caribe, pactuou uma aliança cada vez mais intensa e sólida com Cuba e adotou como um de seus guias o líder histórico desse país, Fidel Castro.
Impulsionou a nova Constituição da República Bolivariana da Venezuela, que entrou em vigor em 1999 e foi emendada em 2009. Em 2001, dispôs medidas sobre a propriedade privada, provocando a reação das classes média e alta e de sindicatos de empregados que em marchas de verdadeiras multidões pediram sua saída do governo. Em 11 de abril de 2002, a maior dessas marchas acabou em tiroteio perto da sede do governo, e deixou 19 mortos e uma centena de feridos.
Nesse contexto, o alto comando militar, com apoio de poderosos setores civis, cometeu um golpe de Estado contra Chávez no dia seguinte, e assumiu o governo de fato Pedro Carmona, presidente da Fedecâmaras, a principal associação empresarial do país, que imediatamente dissolveu os demais poderes do Estado. Porém, militares leais apoiados por milhares de seguidores que cercaram os quartéis em Caracas recolocaram o presidente constitucional em seu cargo horas depois.
No final de 2002, juntou o locaute (greve patronal) de empresas privadas e da produção petroleira com a greve determinada pela direção de sindicatos industriais e de comércio em busca, novamente, da derrubada de Chávez. Dois meses consecutivos com essas medidas de força não conseguiram vencer a resistência, e as instituições democráticas permaneceram estáveis.
Em agosto de 2004, a oposição conseguiu ativar a ferramenta constitucional de referendo para colocar em jogo a continuidade do mandato presidencial de Chávez, mas as urnas novamente lhe foram favoráveis, desta vez com 59% dos votos, em uma jornada transparente controlada pela Organização dos Estados Americanos e pelo norte-americano e não governamental Centro Carter, entre outros observadores.
Com o suporte de Cuba, o governo de Chávez lançou suas “missões” (programas de alimentação, saúde, alfabetização, educação e ajuda financeira diretos aos setores pobres), à margem das burocráticas instituições tradicionais do Estado e convertidas com o passar dos anos no centro de sua oferta política.
Após ser reeleito em dezembro de 2006, o presidente acentuou seu confronto verbal e diplomático com os Estados Unidos, aproximou-se de países alheios à região, como Rússia, China e Irã, rompeu relações com Israel e propôs como objetivo de seu projeto um “socialismo do século 21”. Chávez sempre se definiu como bolivariano, a ponto de colocar esse adjetivo ao nome oficial da Venezuela e a muitas de suas obras e propostas, mas também se confessou com insistência como cristão, humanista, marxista, socialista, antiimperialista, indigenista e operário.
Os preços altos dos últimos tempos no mercado do petróleo, de onde se obtém o “salário nacional” da Venezuela, lhe permitiram estatizar numerosas empresas e colocar toda a economia sob rígidos controles, começando pelo controle do câmbio, mas sem poder deter nem a importação de alimentos nem o afã consumista dos venezuelanos.
Após a rejeição de uma nova reforma constitucional em 2007 por uma ajustada maioria, teve de esperar até 2009 para conseguir que fosse votada sua proposta de reeleição sem limite para a Presidência e outros cargos eletivos. Muito antes, em 2003, em rápida conversa com a IPS, Chávez disse que não aspiraria governar para sempre, “mas apenas dois períodos, até janeiro de 2013, e depois será a vez de outro revolucionário ou outra revolucionária”.
Mas, depois mudou de opinião e propôs que sua continuidade no governo era um requisito para sustentar o projeto, argumentando que as constantes mudanças de administrações na América Latina e no Caribe frustraram iniciativas desse tipo. A busca por esse quarto mandato parece ter causado impacto em sua doença, pois médicos disseram que foi fatal se dedicar em 2011 e 2012 ao governo e à campanha simultaneamente, descuidando de sua saúde. Sozinho in extremis, vítima de uma nova recaída em dezembro de 2012, aceitou ungir como herdeiro Nicolás Maduro, seu candidato a substituí-lo na Presidência.
A primeira grande incógnita que deixa é se a liderança e o apoio popular que teve por 20 anos, 14 deles no governo, migrará para seus herdeiros políticos. Também não se sabe se o chavismo se transformará em um forte movimento político, ao estilo do peronismo na Argentina após a morte de seu mentor, Juan Domingo Perón (1895-1974), ou se somente a figura de Chávez ficará como objeto de culto do protesto da esquerda, como ocorreu com outro argentino, o guerrilheiro Ernesto “Che” Guevara (1928-1967).
Muitas vezes disse que quando chegasse à velhice estaria aposentado, sob a sombra de uma árvore em meio às savanas do sudoeste venezuelano onde nasceu, dando aulas a algumas crianças, talvez cultivando uma de suas paixões, a música e o recital de poesia das planícies que nutriram sua vida. Guerreiro por natureza, “um simples soldado” como gostava de repetir, sempre com uma palavra de combate para explicar qualquer contingência, vencedor de quase todos os seus rivais, um verdadeiro vitorioso na política, não pôde ganhar a batalha contra o câncer que o emboscou e o levou à morte aos 58 anos de idade.
Como legado de Chávez na Venezuela, fica ter colocado o tema da pobreza no centro da vida social e política, ter conduzido a esquerda ao governo ao fim de quase um século de tentativas frustradas, uma certa dessacralização do poder e o fortalecimento de grupos e comunidades que durante décadas estiveram na exclusão ou à beira dela.
Na região, Chávez deixa um discurso e um tecido de relações que apostam na integração, política antes que econômica, segundo sua concepção, e o apoio a governos amigos com base no recurso petrolífero. Assim, separou a Venezuela da Comunidade Andina (Bolívia, Colômbia, Equador e Peru) e a levou para o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai), criou a Petrocaribe para ajudar com petróleo os países da região, impulsionou a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade de Estados da América Latina e do Caribe, o Banco do Sul e uma incipiente moeda regional, o sucre. Envolverde/IPS
(IPS)

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