O PERFUME – A HISTÓRIA DE UM ASSASSINO

Eu já tinha esse livro na minha biblioteca desde 2001, quando o comprei numa livraria na rodoviaria de Porto Alegre, mas nunca tive curiosidade de fazer uma leitura cuidadosa pois sempre tinha outros na frente. Mas, independente da minha falta de atenção, “ O PERFUME – A História de um Assassino” (lançado em 1985) foi considerado o livro da década de 80 na Alemanha. E só depois que alguém apareceu aqui em casa fazendo propaganda com estardalhaço do filme é que tive vontade de ler e acabei devorando (várias vezes) a obra de Patrick Süskind – um alemão careca de 57 anos e com nome de comida japonesa – que atualmente vive na Alemanha , raramente dá entrevistas ou aparece em público e ainda prefere levar uma vida isolada.

Contudo, a ntes mesmo de abrir o livro, já me intrigava com o seu título. E me perguntei: qual o rosto escondido por trás da máscara do protagonista? (ou seria melhor dizer antagonista?) Por que “ O PERFUME” como título de livro? Segundo os bastidores da música, até o Kurt Cobain era fã desse livro. Alguns críticos dizem que o falecido vocalista da banda de rock Nirvana usou trechos do livro de Süskind como inspiração, na época da composição do disco “In Utero” (1993), tanto que a música "Scentless Appretince" foi baseada nesse livro.   

O romance escrito por Süskind conta a história de Jean-Baptiste , um homem que possui um olfato extraordinariamente apurado mas que não possui cheiro próprio, nem pudores, nem limites. O autor, por sua vez, fez um trabalho memorável ao descrever a Paris do século XVIII que é o cenário que nasce Jean-Baptiste – abandonado por sua própria mãe em meio às tripas de peixes, podridão e ratos. E quando acham seu corpo levam-no para um orfanato aonde, tempos depois, o menino cresce e todos que têm contato com ele acham-no repulsivo de uma forma estranha. O que ninguém percebe é que o corpo de Jean-Baptiste não tinha um aroma, e essa distinção é tão sutil que ninguém percebe diretamente na obra. A falta de cheiro de Jean-Baptiste pode ser vista mais tarde como um representante de sua falta de moral em um mundo no qual o amoral e o ético lutam para achar um denominador comum.

O excelente ator Ben Whishaw interpretando Jean-Baptiste, no filme dirigido por Tom Tykwer.

O ENREDO – Durante toda a sua vida Jean-Baptiste teve vários acidentes, doenças e chagas. Trabalhou como aprendiz de curtidor e depois como aprendiz de perfumista. Sua obsessão com cheiros é tanta e tão absoluta que, então com 14 anos, ele apresenta a si mesmo a um proeminente – porém falido – perfumista ( Baldini ) que o ensina a arte anciã de misturar óleos, dissecar e isolar aromas, e reduzir flores e ervas a seus óleos essenciais.

Um dia Jean-Baptiste encontra uma linda jovem de 12 anos com um perfume natural totalmente diferente de todos os outros que ele guardava na memória, e acabará por matá-la por assidente, com as suas próprias mãos, de tanto desejar apoderar-se do seu odor. Mas, esta jovem é apenas uma das muitas jovens que o protagonista mata (acho que 26 no total), em busca do perfume perfeito.

Jean-Baptiste é capaz de evocar as mais diferentes emoções no leitor, desde simpatia, curiosidade, repulsa e ódio, que mostra um profundo autismo ao aprender cheiros diferentes à sua volta como a maioria das crianças aprende o alfabeto, ou contam números no jardim de infância. Dessa forma, ele passa seus dias identificando e organizando os cheiros em seu mundo particular – parece um autista.

MUNDO DOS PERFUMES – A ação divide-se entre o mundo dos perfumes que serve para encobrir o mundo dos fedores, dos crimes, das mentiras e da hipocrisia que caracterizam a cidade de Paris no século XVIII – muito parecida com o que atualmente vivemos no Brasil com as suas CPIs. O livro, até pouco tempo considerado inadaptável para a linguagem cinematográfica, foi transformado em filme no ano passado (*confira o cartaz ao lado) pelo também alemão Tom Tykwer (de “ Corra, Lola, Corra” ) e, segundo vários sites de cinema, o próprio Süskind negociou os direitos de filmagem com o produtor.

O filme contou com um elenco de celebridades, tais como o maravilhoso Dustin Hoffman , de belas mulheres, de uma bela fotografia e de um roteiro muito interessante. Jean-Baptiste foi interpretado pelo até então desconhecido ator Ben Whishaw . O orçamento da produção extrapolou o valor de 50 milhões de euros, segundo informações contidas no site da Deustche Welle , mas valeu a pena: o filme ficou muito bom.

SUI GENERIS – Quando os críticos e leitores sentiram pela primeira vez o aroma de “ O PERFUME” em 1985, ele prontamente tornou-se um best-seller internacional sendo traduzido para 37 línguas diferentes. O livro de Süskind é sui generis : meio horror, meio suspense, meio ficção histórica, meio erótico, meio repulsivo, meio romance, meio melancólico. Ao mesmo tempo que oferece muitos insights na mente do criminoso insano, também especula sobre o papel que o senso comum tem em nossas vidas.

Contudo, “ O PERFUME” é, sem dúvida, um romance muito estranho. Mais inquietante ainda é o fato de Jean-Baptiste ser desprovido de odor corporal, o que leva a sociedade a encará-lo com um misto de indiferença e mistério. Curioso é a maneira como o autor utilizou para descrever alguns personagens: o tosco Druot , que cheira a esperma e suor; as mulheres plácidas, feitas de mel escuro; Madame Arnulfi , a viúva cheia de vitalidade; e as virgens mortas de membros carnudos, lisos e firmes.

Todo este mundo irreal e de certa forma sobrenatural acaba por ser um pretexto que o autor utiliza engenhosamente a fim de explorar as paixões básicas que movem a humanidade: o erotismo, o poder, a necessidade de afirmação e a procura de si próprio, retratada aqui na busca do perfume ideal . E embora esta seja a história de um assassino, o próprio subtítulo o indica, os crimes acabam por diluir-se, como que desculpados pela pureza das intenções destituídas de qualquer tipo de moralidade. É por este motivo que o fim deixa um travo amargo, já que não se retiram conclusões e só a dúvida fica no ar.

MENTES ABERTAS – Apesar de muita coisa do livro ter sido dispensada na versão cinematográfica, “ O PERFUME” é um livro que deve ser degustado de mente aberta, deixando de lado preconceitos e juízos de valor, porque só assim se poderá apreender a beleza de caráter mórbido que se desprende das páginas e a crítica subjacente: quantos são frágeis e dependentes do “eu animal”.

Aquela parte onde o autor explica que o senhor Richis desejava ardentemente a sua própria filha, Laure , a ruiva, que ele desejava “deitar-se junto a ela, sobre ela, dentro dela, com toda a sua concupiscência e todo o seu desejo. E ele ficava a suar, e o os membros tremiam, enquanto sufocava em si esse horrendo desejo e se curvava na direção dela, para acordá-la em um casto beijo paternal” é de deixar os puritanos de cabelos em pé. E eu, como sempre, achei muito excitante.  

No final da história, Jean-Baptiste volta a Paris e é partido aos bocados e comido por pessoas devido ao efeito do perfume que tinha derramado por todo o corpo: um final trágico para o protagonista. E q ual o significado desta morte horrível? Pode-se ter a falsa impressão de que o autor queira afirmar que os idealistas são consumidos pelas massas ou pela podridão que o sistema produz. Mas as últimas linhas do texto fazem pensar em algo diferente: “ ...seus corações estavam bem leves(...) . Pela primeira vez , haviam feito algo por amor ”  (“O PERFUME – A História de um Assassino” de Patrick Süskind, traduzido por Flávio R. Kothe, 255 pág. 1985 - Editora Record)

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