Lagoas pra que te quero

Quando comparamos fotografias e mapas antigos com imagens de hoje, vemos que os governos de São Paulo gastaram rios de dinheiro para drenar as várzeas dos Rios Tietê e Pinheiros a fim de ampliar o espaço destinado à urbanização. O resultado foi o estrangulamento dos rios e a impermeabilização do solo. Com qualquer chuvinha, São Paulo alaga e traz transtornos ao trânsito. Para resolver os problemas que o poder público e a sociedade criaram, rios de dinheiro foram gastos para construir piscinões que absorvam águas pluviais quando das chuvas torrenciais. Claro que o dinheiro para destruir e para construir não foi jogado fora. Sempre há bolsos privados para recolher dinheiro público.

Aconteceu o mesmo no Rio de Janeiro. Historiadores mostram como a cidade cresceu sobre brejos (sempre desprezados pelos órgãos governamentais de ambiente), lagoas e rios. A prática comum foi a de drenar brejos e lagoas e de canalizar e esconder rios sob a cidade. Os rios que ficaram expostos passaram a receber esgoto e lixo, tornando-se verdadeiras valas negras a céu aberto. A própria Baía de Guanabara, tão admirada por viajantes brasileiros e estrangeiros, transformou-se numa cloaca.

Agora, com a proximidade do campeonato mundial de futebol e com as Olimpíadas, o governo planeja gastar rios de recursos públicos para despoluir a Baía de Guanabara e rios, quase todos eles afluentes da baía. A fim de livrar-se dos problemas causados pelas enchentes, a prefeitura do Rio vai escavar o solo da cidade para instalar cinco piscinões e canalizar rios. As obras custarão R$ 292 milhões. Claro que se ganhou dinheiro destruindo e agora vai se ganhar também para construir um sistema muito aquém em eficiência do que aquele que a natureza dava de graça. Em termos de matemática pura, 10-10=0, mas, nos termos de uma economia de mercado, 10-10=20. E quem paga é sempre o povo.

Pulemos para a região norte-noroeste do Rio de Janeiro e sul do Espírito Santo, que denomino de Ecorregião de São Tomé. Nela, a drenagem natural se efetua pelas bacias dos Rios Itapemirim, Itabapoana, Guaxindiba, Paraíba do Sul (incluindo a Lagoa Feia) e Macaé. Excetuando-se as Bacias do Guaxindiba e do Macaé, todas as outras provêm da Zona da Mata (em Minas Gerais). O Rio Paraíba do Sul, particularmente, é o maior veículo de drenagem da Ecorregião, pois também coleta água do Sul Fluminense, do Médio Paraíba, da Região Serrana e do Centro-Norte Fluminense. Entre estes rios principais, ainda há uma infinidade de pequenos cursos d'água e de lagoas, hoje em grande parte drenados, barrados e at errados. A cobertura florestal, de quase 100% nos primórdios da colonização portuguesa, está reduzida a cerca de 4%, se tanto.

Além disso, muitos núcleos urbanos se ergueram em áreas de risco, dificultando mais ainda a drenagem superficial. Em face das enchentes periódicas da região, sobretudo as de 2007, 2008 e 2012, o governo estadual, por meio do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), pretende gastar R$ 602 milhões para construir um sistema que reduza o impacto das enchentes nos Rios Pomba e Muriaé, ambos tributários do Paraíba do Sul. No Rio Pomba, o projeto prevê a dragagem e a retirada das pedras do leito do rio. As pedras estão lá há mais de 600 milhões de anos e podem continuar lá. O material particulado depositado no fundo resulta da erosão e do assoreamento. Até agora, o INEA nada falou em promover obra de fô lego para reflorestamento.

No Rio Muriaé, a intenção é abrir canais extravasores antes de algumas cidades, desviando o excesso de água para a zona rural, onde serão construídas bacias de acumulação que liberarão as águas por outro canal que alcançará o rio depois da cidade. Já discuti amplamente este projeto no espaço na Folha da Manhã. Causa estranheza que ele não tenha sido encaminhado ao Comitê da Região Hidrográfica IX, órgão consultivo e deliberativo para o baixo Paraíba do Sul. O projeto, se é que existe, se é que não passa de uma série de slides tendo por trás uma pletora de cálculos matemáticos, foi apresentado nas principais cidades do noroeste fluminense. Sendo o INEA o órgão executor, certamente o projeto foi contratado por este órgão e dispensado de Estudos Prévios de Impacto Ambiental.

Ao mesmo tempo, o INEA não se incomoda com o destino dos pequenos cursos hídricos que correm entre os Rios Itabapoana e Paraíba do Sul. Não pensa em avocar as lagoas da margem esquerda dos Rios Muriaé e Paraíba do Sul. A Lagoa da Onça que o diga. Se a ligação das Lagoas da Onça, da Boa Vista, do Lameiro, Limpa, das Pedras, do Jacu, do Cantagalo, do Vigário, de Maria do Pilar, do Taquaruçu, da Olaria, do Fogo e de Brejo Grande com os Rios Muriaé e Paraíba do Sul fosse restabelecida e conservada, contaríamos com excelentes piscinões que a natureza nos deu de graça. Uma vez cheios com águas excedentes dos dois rios, comportas seriam fechadas e só abertas quando o nível dos rios baixasse.

Mas, pelo visto, o governo deixará que se ganhe dinheiro com a destruição dessas lagoas para depois contratar alguma firma que construa piscinões, também ganhando dinheiro.

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