Natureza: um novo agente revolucionário

No final da vida, Michel Foucault ministrou um curso no Collège de France manifestando simpatia pelo neoliberalismo. Como anarquista, Foucault vislumbrou no neoliberalismo uma arma de destruição do Estado. Na verdade, o neoliberalismo enfraquece o Estado e o transforma em instrumento para seus objetivos. A crise econômica, social e ambiental é atualmente, responsabilidade dele. Por este prisma, o neoliberalismo não é o agente revolucionário da atualidade, a menos que se considere seu poder de fabricar crises econômicas, miséria social e devastação ambiental que levarão à sua destruição.
Zygmunt Bauman, Stéphane Hessel e Edgar Morin acreditam ser possível exercer controle sobre o capitalismo. O Estado e a sociedade seriam as instâncias controladoras, estabelecendo limites ao lucro, promovendo justiça social e protegendo o ambiente. Não que eles acreditem no capitalismo. A bem dizer, os três e outros mais percebem que o capitalismo não pode ser superado no momento presente. Morin concebe um Estado forte no plano interno, mas que reduz sua soberania em prol de uma organização mundial, como a ONU, por exemplo. Pelo menos, os três não se posicionaram como Mao-tse Tung, que, depois de levar milhares de pessoas à morte em duas revoluções contra o capitalismo, concluiu que este ainda não poderia ser destruído.
Ex-marxista, mas com posições de esquerda, como Edgar Morin, Immanuel Wallerstein prevê o fim do capitalismo, devorado em suas contradições internas em prazo médio. Ele toma o cuidado de não definir como será o sistema sucessor do capitalismo. Assim, o agente destruidor serão as sucessivas crises do modo de produção.
Entre os marxistas - ortodoxos ou não -, há posturas as mais diversas. Existem os que continuam acreditando na classe operária como sujeito revolucionário, apesar da falência de todas as experiências socialistas. Há os que assumem o marxismo solitariamente, como forma de resistência pessoal ao capitalismo. Há os que afirmam a grande influência do marxismo na atualidade. Em entrevista concedida à "Folha de São Paulo" de 17/11/2013, o filósofo marxista István Mészáros, com razão, acusa o capitalismo de produzir crises que geram desemprego, aumentam o número de miseráveis e agridem o planeta. Ao que parece, a natureza é, para ele, um palco violado pelo capital. Mas, apesar da atualidade do marxismo, Mészáros não esclarece quem será o sujeito revolucionário transformador.
Michael Löwy, pensador marxista nascido no Brasil e radicado na França, formulou o ecossocialismo, projeto excelente. Mas quem será o sujeito a viabilizá-lo? Certamente, as classes sociais desfavorecidas. Por outro lado, o filósofo marxista esloveno Slavoj Žižek vê a grande massa de miseráveis do mundo como potenciais agentes da revolução socialista, contando com o apoio de pequenos empresários e de intelectuais comprometidos com a causa da transformação. Ao mesmo tempo, contudo, reconhece que os miseráveis tendem a se converter às igrejas evangélicas ou a cair na criminalidade.
Neste breve panorama, que não pretende ser exaustivo, o "Homem", sempre ele, é o único animal capaz de transformar o mundo. Examinando a história do Universo, assumo uma atitude humilde. Há forças naturais com enorme capacidade de transformação. Foram eventos naturais que provocaram as maiores crises ambientais enfrentadas pela Terra, antes que o "Homem" andasse sobre ela. Num ponto, concordo que o "Homem" é capaz de produzir grandes transformações. Desde a primeira revolução industrial, ele vem agredindo a humanidade e a natureza de forma nunca vista antes.
Na mitologia grega, Pandora foi a primeira mulher. Ela se casou com Epimeteu, que ganhou dos deuses uma caixa mantida sempre fechada. Ela encerrava todos os males do mundo. Mesmo com a forte recomendação de nunca abrir a caixa, Pandora não resistiu à tentação de conhecer seu conteúdo e desrespeitou o marido, assim como Eva desrespeitou a ordem de Deus. Desse modo, nasceram todos os males do mundo. Dentro da caixa, ficou apenas a esperança. A parábola se aplica perfeitamente aos sistemas capitalista e socialista pós-revolução industrial. A diferença é que, agora, nem a esperança restou. Os "Homens" perderam o controle sobre sua obra. Se existe esperança de transformação, ela passou às mãos das forças irracionais da natureza, ampliadas de forma imprevisível pelas ações humanas.
A natureza enfurecida, mas não vingativa, destruirá estruturas, causará muitas mortes, mas não extinguirá a espécie humana. Depois de tudo, os sobreviventes talvez consigam criar uma civilização social e ecologicamente sustentada.