UPP assassina dois jovens no Cantagalo

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Amigos e familiares do dançarino Douglas se emocionaram no enterro do jovem

Na madrugada do dia 20 para 21 de abril nossa equipe de reportagem foi aos morros Cantagalo/Pavão-Pavãozinho, na zona Sul do Rio, checar a denúncia de que policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) teriam assassinado o jovem dançarino do programa “Esquenta” da Rede Globo, Douglas Rafael da Silva Pereira, de 27 anos, o DG. Quando chegou ao local, nossa equipe se deparou com um cenário de rebelião popular. Várias ruas no entorno da favela foram bloqueadas pela PM, incluindo a Avenida Nossa Senhora de Copacabana, uma das principais do bairro.

Já eram 22h e o morro estava sem luz desde as 18h. Segundo moradores, PMs teriam cortado a luz da favela para atacar moradores na escuridão. Mesmo assim, nossa equipe subiu o morro na companhia de outros membros de coletivos da imprensa popular e da líder comunitária Deize Carvalho. A liderança criticou a UPP e disse que os moradores já não aguentam mais os abusos cometidos pela polícia na favela.

— Eu nunca tinha visto a comunidade dessa forma nos meus 43 anos. Eu vi a dor e a revolta nos olhos das pessoas, principalmente das crianças. Isso não foi coisa de traficante, porque a gente sabe que quando é coisa de traficante, a população se acua com medo de protestar. As crianças que começaram a jogar pedra na polícia. Um policial chegou a dizer que “se entrassem no caminho dele, ele atiraria para matar, não importando se fosse adulto ou criança”, que “se as crianças podiam jogar pedra, podiam tomar um tiro também” — diz.

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Maria de Fátima, mãe de Douglas, foi corajosa em denunciar que policiais o assassinaram

Dito e feito. Momentos depois, o jovem deficiente físico, Edílson da Silva, de 16 anos, que protestava em repúdio ao assassinato de Douglas, foi baleado na barriga e não resistiu aos ferimentos. A morte de Edílson inflamou ainda mais a população dos morros Cantagalo/Pavão-Pavãozinho que fez barricadas por todos os becos e vielas da favela. Um grupo de oito PMs da UPP chegou a ter que se esconder dentro da casa de um morador, mas foi descoberto pelas massas, que cercaram o local com pedras, paus e garrafas. Somente com a chegada de reforço, os policiais conseguiram deixar o imóvel.

— Será que eles [policiais] não têm família? Eles não compreendem que isso tudo é fruto de uma dor, de uma revolta com essa polícia? O povo aqui dentro não aguenta mais esculacho e mentira dessa polícia. Quantos DGs vão ter que morrer para esse governo entender que o nosso problema não um problema de polícia? A gente não quer uma polícia que mata, que extermina. Antes, qualquer um que morria era bandido. E o DG? Eles vão dizer o quê? Que era bandido? — pergunta Deize.

Como se adivinhasse a pergunta, o monopólio da imprensa respondeu no dia seguinte: divulgou fotos que seriam do dançarino, armado com um fuzil calibre .762, mas que na verdade mostram um bandido da Vila Aliança, morto em uma operação em 2009. A farsa demorou menos de 24 horas para ser desvendada e nenhuma nota ou errata foi publicada pelos veículos do monopólio para corrigir o erro. Em frente a 12ª DP, a mãe de DG, a auxiliar de enfermagem Maria de Fátima, de 52 anos, desabafou e disse que continuará lutando por justiça para os assassinos de seu filho.

— Olha aqui a identidade e cartão da Globo de saúde dele, tudo molhado. Eu quero saber por que, se o corpo e as roupas dele estavam secas. Quero saber também por que ele morreu à 1h da madrugada e a UPP só deixou a mãe da filha dele ver o corpo às 13h. E mesmo assim, isso só aconteceu porque chegou o pessoal dos direitos humanos. O que eles queriam esconder? Ela foi correndo me avisar, mas eu já tinha sentido. O porteiro do meu prédio também tinha me avisado que alguma coisa estava acontecendo no morro e que o DG estava lá. Por que tiraram os documentos dele? Eu vou falar isso toda hora. Que pacificação é essa que tira o direito de ir e vir das pessoas? Ninguém aguenta mais isso. Ele ia virar mais um Amarildo? — pergunta a auxiliar de enfermagem fazendo referência ao operário da construção civil Amarildo de Souza. Torturado e morto por PMs da UPP da Favela da Rocinha ele teve seu corpo escondido por seus assassinos. Até hoje, Amarildo não foi encontrado.

Douglas foi enterrado no dia 24 e Edílson no dia 25, ambos no cemitério São João Batista, em Botafogo, zona Sul da cidade. No enterro de Douglas, a mãe do jovem questionava a presença ostensiva de policiais militares na entrada do cemitério.

— Mataram o meu filho e ainda têm coragem de vir ao enterro. Por quê? Ninguém os convidou. Eu não os quero aqui. Eu tenho nojo, repulsa. Eu tenho o direito de estar só com o meu filho e os amigos dele da comunidade. Eles estão aqui para homenagear o amigo querido — protesta.

Cerca de duas mil pessoas acompanharam o funeral de Douglas, que foi marcado por muita dor e comoção. Amigos carregaram o caixão do jovem da capela até sua sepultura enquanto a massa gritava o nome do dançarino. A revolta era tamanha, que após o enterro, moradores do Cantagalo/Pavão-Pavãozinho saíram em passeata pelas ruas de Copacabana até a ladeira Saint-Roman, que dá acesso ao morro. No local, manifestantes foram atacados pela PM com bombas de gás lacrimogêneo e efeito moral. Na confusão, eu, Patrick Granja, fui ferido por estilhaços de bomba na barriga e joelho.

— Ele amava esse morrão. A mãe da filha dele mora lá, os amigos dele moram lá e ele vivia subindo e descendo aquela favela. Ele adotou essa favela como se fosse dele. Então eu quero que essas populações dessas favelas sejam respeitadas em nome dele, por ele. Eu vou continuar levantando essa bandeira para o resto da minha vida — diz a auxiliar de enfermagem.

— Os moradores, 99% são pessoas de bem. Infelizmente, a visão das autoridades é que todo mundo é bandido. Sendo que são pessoas de bem, que acordam cedo para ir trabalhar todos os dias. São jovens pobres que lutam contra a triste realidade da juventude hoje no país. Eles[PMs] sobem para acabar com sonhos, com alegrias de família dentro da comunidade. Como nós podemos aceitar esse projeto que eles chamam de pacificação, quando na verdade a polícia sobe o morro preparada para uma guerra? Nossa população já está cansada de guerra — diz um morador na entrada do cemitério.

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